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Editados por HARLEQUIN IBÉRICA, S.A.

Núñez de Balboa, 56

28001 Madrid

 

© 2012 Olivia Gates

© 2014 Harlequin Ibérica, S.A.

A conquista do xeque, n.º 1169 - Janeiro 2014

Título original: The Sheikh’s Redemption

Publicado originalmente por Harlequin Enterprises, Ltd.

 

Reservados todos os direitos de acordo com a legislação em vigor, incluindo os de reprodução, total ou parcial. Esta edição foi publicada com a autorização de Harlequin Books S.A.

Esta é uma obra de ficção. Nomes, carateres, lugares e situações são produto da imaginação do autor ou são utilizados ficticiamente, e qualquer semelhança com pessoas, vivas ou mortas, estabelecimentos de negócios (comerciais), feitos ou situações são pura coincidência.

® Harlequin, Harlequin Desejo e logótipo Harlequin são marcas registadas propriedades de Harlequin Enterprises Limited.

® e ™ são marcas registadas por Harlequin Enterprises Limited e suas filiais, utilizadas com licença. As marcas em que aparece ® estão registadas na Oficina Española de Patentes y Marcas e noutros países.

Imagem de portada utilizada com a permissão de Harlequin Enterprises Limited. Todos os direitos estão reservados.

 

I.S.B.N.: 978-84-687-4988-4

Editor responsável: Luis Pugni

 

Conversão ebook: MT Color & Diseño

Prólogo

 

Vinte e quatro anos atrás

 

Haidar recebeu uma bofetada na cara que o queimou como o fogo. Antes que pudesse apanhar ar, recebeu a seguinte na outra face, desta vez com as costas da mão e mais forte. Um anel com pedras preciosas incrustadas traçou-lhe uma linha de dor na pele. Desorientado, ouviu o bramar de um trovão enquanto as lágrimas lhe nublavam a vista. A reprimenda continuou enquanto recebia mais bofetadas. Uma delas terminou finalmente com o seu equilíbrio e caiu de joelhos. As lágrimas ardiam-lhe no corte como um antisséptico e misturavam-se com o sangue.

Ouviu uma voz tranquila dizer:

– Se derramares mais lágrimas, encerrar-te-ei na masmorra durante uma semana, Haidar.

Ele engoliu em seco e olhou para a pessoa que mais amava no mundo. Estava paralisado e não entendia o que sucedia. Por que motivo estava a fazer-lhe isto?

A sua mãe nunca lhe tinha posto a mão em cima. Nem sequer lhe tinha puxado pela orelha como fazia com Jalal, o seu irmão gémeo, quando descobria alguma das suas traquinices. Era o seu favorito. Ela mesma lho tinha dito e lho tinha demonstrado de inúmeras formas.

E no entanto, ultimamente tinha-se mostrado descontente com ele ainda que não tivesse feito nada de mal. Inclusive quando fazia algo digno de louvor. Haidar sentia-se desconcertado, mas não estava preparado para aquele arrebato repentino de fúria quando esperava a sua aprovação.

A mãe fitou-o com frialdade a partir da sua majestosa altura digna de uma deusa.

– Não agraves a tua estupidez com lamúrias. Levanta-te e recebe o castigo como o teu irmão o recebe sempre, com dignidade e coragem.

Haidar esteve a ponto de exclamar que eram Jalal e o seu primo Rashid os merecedores do castigo. Ele tinha-se negado a participar e tinha-os advertido contra aquela «experiência» que provocara o incêndio que queimou todo um aposento do palácio e que arruinara a celebração do seu décimo aniversário. Jalal e Rashid, normalmente mais selvagens e inconscientes, já tinham queimado todas as suas segundas oportunidades com os mais velhos. Teriam recebido um castigo mais severo. Ao ser aquele que possuía um historial mais limpo, deu-se como culpado pelo acidente.

A confissão provocou o que esperava do seu pai e do tutor de Rashid: surpresa e aceitação das suas explicações. Mas então a sua mãe foi vê-lo. Os seus olhos diziam-lhe que sabia o que na realidade se tinha passado e por que se tinha dado como culpado. Haidar esperava admiração da sua parte. Mas o que recebeu foram as bofetadas que não cessaram nem quando o seu marido, o rei de Zohayd, lhe ordenou que se detivesse.

Haidar levantou-se e levou uma mão trémula à ferida da face esquerda. Ela afastou-lha com a mão.

– E agora vai pedir perdão ao teu irmão e ao teu primo por teres demorado tanto a reconhecer a tua culpabilidade e teres estado a ponto de provocar que eles fossem castigados.

Haidar sentiu uma pontada de dor e de assombro no peito. Uma coisa era receber o castigo em nome deles, outra era desculpar-se perante eles diante de todos os presentes: parentes, criados... e raparigas.

A sua mãe segurou-lhe a cara com violência, cravando-lhe as longas unhas na ferida.

– Fá-lo! – ordenou-lhe com um empurrão e obrigou-o a olhar para Jalal e para Rashid.

Os meninos tinham a cabeça agachada e estavam corados.

– Jalal, Rashid, olhem para o Haidar – a sua mãe falou então como a rainha de Zohayd, com voz clara e exigente. – Não o libertem da desgraça de suplicar o vosso perdão diante de todos.

Jalal e Rashid olharam-na antes de olhar para ele. O arrependimento brilhava-lhes nos olhos.

– Diz-lhes que lamentas e que nunca mais voltarás a fazer algo assim – ordenou a sua mãe.

Ardendo de raiva, Haidar olhou para o irmão gémeo nos olhos e depois para os do primo e melhor amigo e repetiu as suas palavras.

 

 

– Eu não fiz nada! – exclamou Haidar enquanto a sua mãe terminava de lhe curar a ferida.

Agora que estavam na intimidade dos aposentos da rainha, tinha de exonerar-se, ainda que fosse só perante os seus olhos.

Ela tinha um sorriso cheio de amor e de orgulho enquanto lhe beijava a ferida que ela mesma lhe tinha feito.

– Eu sei. Eu sei de tudo.

Com que então não se tinha enganado. A confusão de Haidar aumentou.

– Então, porquê?

A sua mãe acariciou-lhe a face com ternura.

– Foi uma lição, Haidar. Queria demonstrar-te que nem o teu irmão gémeo nem o teu melhor amigo diriam uma palavra para te salvar. Agora sabes que ninguém merece que te sacrifiques por ele. Agora sabes que não podes confiar em ninguém. E o mais importante: agora sabes o que é a humilhação, e a partir de agora farás qualquer coisa para não a voltar a sofrer.

Haidar sentiu a cabeça à roda.

A sua mãe agachou-se para o abraçar.

– Tu és parte de mim e farei qualquer coisa para que nunca sofras, para que te convertas no homem que consegue tudo o que merece. Ter o mundo aos teus pés. Entendes porque tive de te fazer mal?

Aturdido pela nova perspetiva que lhe tinha mostrado, Haidar assentiu. Em parte porque queria sair dali para pensar.

Ela acariciou-lhe a cabeça e sussurrou:

– Este é que é o meu menino.

 

 

Oito anos atrás

 

– És igual à mãe.

Haidar deu um salto como se lhe tivessem dado uma bofetada. Jalal tinha uma faca espetada no peito desde que tivera consciência de como era a sua mãe. De como lhe chamavam: Rainha Demónio. Para pesar de Haidar, teve de reconhecer que o título estava bem-posto. A sua mãe tinha uma beleza que não era deste mundo e uma inteligência brilhante, mas brandia os seus atributos como armas letais. Gabava-se de não se deixar levar pela fraqueza da benevolência. Em lugar de utilizar os seus dons para conseguir amigos, rodeava-se de criados e séquitos acobardados. E gostava de criar inimigos, o primeiro deles o seu próprio marido.

Se não fosse pelo profundo amor que sentia pelos filhos, sobretudo por Haidar, duvidaria que fosse humana.

Mas o que atormentava Haidar à medida que ia crescendo era perceber que se parecia com ela. Sentia a mancha da sua fúria, os seus defeitos. Vivia com medo de que um dia fossem mais fortes do que a sua parte decente e compassiva. Resultava irónico que Jalal lhe deitasse agora à cara aquela parecença, quando começava a sentir como se retirava a sombra da sua mãe, como o seu legado afrouxava o nó da forca.

Desde que conheceu Roxanne.

– Retiro-o – Jalal, o gémeo que não se parecia nada com ele, abanou a cabeça com desgosto. – És pior do que ela. E eu que pensava que não era possível.

– Falas como se a mãe fosse um monstro.

Nunca falavam abertamente da mãe. De facto, cada vez falavam menos em geral.

Jalal encolheu os ombros.

– E amo-a apesar de tudo. Com o tipo de amor incondicional que uma mãe desperta no seu filho. Mas tu não tens a mesma sorte. Neste assunto não. Neste caso, não posso perdoar a tua crueldade.

Incapaz de lidar com a desaprovação do seu irmão gémeo, como lhe ocorria sempre, deixou-se levar pela fúria e pelo receio que o tinham levado àquele confronto.

– Com que então esta é a tua estratégia? Lançar acusações para vencer o inimigo?

– És tu que lanças a pedra e depois escondes a mão.

O desprezo de Jalal pôs-lhe os nervos ainda mais em franja.

– Nunca pensei que terias tão mau perder quando a Roxanne me escolhesse a mim.

Jalal expulsou o ar pelo nariz. Dos olhos saíam-lhe faíscas de gelo negro.

– Porque a manipulaste. Enganaste-a.

Haidar conteve outro arrebato de indignação.

– Não tens outra desculpa melhor por teres tentado roubar-ma? Os dois sabemos que posso conseguir a mulher que quiser sem ter de me esforçar e muito menos manipular.

– Não podias ter tido a Roxanne sem enganá-la. Ela apercebeu-se na primeira noite da tua frieza. A personagem que criaste para que se apaixonasse por ti era digna de um Óscar.

Haidar nunca tinha recorrido à violência, nem sequer quando era um menino rodeado de parentes varões que resolviam os seus assuntos com contundência. Sempre tinha contido o seu génio e tinha utilizado a frieza para os superar. Agora o que queria era dar um soco a Jalal na cara.

– A situação continua a ser a mesma: ela é minha – afirmou apertando os dentes.

– E trataste-a como se fosse tua propriedade. Pior ainda, como um segredo sujo, obrigando-a a ocultar-se inclusive perante a sua mãe, obrigando-a a ver como seduzias outras mulheres em público. Disseste-lhe que o fazias para não levantar suspeitas, não foi? Deve ser terrível para ela ainda que acredite nas tuas mentiras. Não posso imaginar o que se passaria se soubesse que tens andado a brincar com ela desde o princípio, que é só mais uma fonte para alimentar o teu ego monstruoso.

Haidar estremeceu de ira.

– E tu sabes tudo o que se está a passar porque és o seu generoso confidente, não é? E queres levar essa amizade para a cama. Pois sinto muito, mas nessa cama estou eu com ela.

Jalal exalou um suspiro de desprezo.

– Muito cavalheiro da tua parte contares isso.

– Não faz sentido negar, tu sabes que somos amantes. E no entanto, queres afastá-la de mim.

– Tu nem sequer a desejas – sussurrou Jalal entre dentes. – Seduziste-a para competires comigo. Não é mais do que um peão noutro dos teus jogos de poder.

– Foste tu quem começou o jogo, não sei se estás esquecido.

– Esqueci-me dessa estúpida aposta passados cinco minutos. Mas tu levaste-a a peito, como sempre, com uma competitividade doentia. Pregaste-lhe uma partida.

– E tu quere-la resgatar do monstro que eu sou? Admites que a queres para ti?

Jalal apertou os maxilares.

– Não vou deixar que a continues a utilizar.

A fúria nublou a visão de Haidar. E então optou pela estratégia que sempre tinha utilizado com aquele rival de longa data: a provocação.

– E como vais impedi-lo?

Jalal lançou-lhe um olhar letal.

– Contar-lhe-ei tudo.

Haidar sentiu que lhe estoirava a cabeça. Mas limitou-se a retorquir:

– Boa sorte.

– Disto não pode sair nada de bom. Não és só como a mãe, herdaste o pior das duas partes da família. És manipulador e ciumento, frio e controlador, e tens sempre de ganhar a todo o custo. Já é hora de mostrar à Roxanne a tua verdadeira cara.

Haidar sentiu o sangue a arder.

– O teu plano tem um pequeno buraco. Se o fizeres, nunca mais vai querer ver a minha cara, mas a tua também não.

– Não me importo de perder a Roxanne desde que tu a percas também.

– Se lhe disseres, nunca mais te quero voltar a ver, Jalal.

Os olhos do seu irmão escureceram.

– Isso também não me importa.

Fechou a porta, o que evitou a série de impropérios que o seu irmão gémeo lhe ia lançar.

Roxanne.

Quando entrou na sala ardeu-lhe o sangue e acelerou-se a respiração. O efeito que exercia sobre ele ia crescendo à medida que passava o tempo. E Haidar pensava que o caso deles seria apenas uma aventura sexual que terminaria quando desaparecesse a fascinação. Até ela ter aparecido, não se julgara capaz de atingir tais cumes de paixão e de sentimento. Roxanne era fogo puro, de uma beleza incandescente e um espírito tempestuoso. E era sua.

Tinha de lho demonstrar de uma vez por todas.

O temor a que sentisse algo por Jalal tinha estado a ponto de dar com ele em louco. O comentário da sua mãe, mencionando o muito que Roxanne e Jalal partilhavam, tinha colorido a sua visão da profundidade da relação. Mas o medo começava a ganhar raízes quando soube que Roxanne tinha revelado a sua essência a Jalal e não a ele. Aquilo tinha acabado com a sua restrição, obrigara-o a travar aquele confronto com o irmão.

Jalal tinha sido muito claro na sua postura.

Mas isso não importaria se Roxanne o escolhesse a ele, como devia ser. Tratou de obter a confirmação com o brilho dos seus olhos, que sempre se alumiavam quando o viam. Mas quando o olhou, os seus olhos não refletiram nada. E em seguida dirigiu a vista para Jalal.

Haidar chegou-se a ela e espetou-lhe os dedos no braço com urgência. O coração batia muito depressa.

– Diz ao Jalal que não se pode intrometer entre nós. Diz-lhe que és minha.

O rosto de Roxanne adquiriu uma expressão estupefacta. Depois tornou-se duro e afastou-lhe a mão.

– Foi por isso que me pediste que deixasse tudo? És repulsivo.

– Tenho notado que o Jalal tem ideias erradas a teu respeito. Tinha de as cortar pela raiz.

Roxanne arregalou os olhos e olhou-o com fúria.

– Tanto me faz o que tens notado. Não me podes mandar chamar como se fosse um dos teus lacaios nem me podes meter num confronto e exigir que repita o que tu dizes. És tu que estás enganado ao pensar que tens algum direito sobre mim.

Haidar sentiu um baque no coração.

– Claro que tenho direito. O que tu me outorgaste quando te enfiaste na minha cama e me disseste que me amavas.

– Mas lembras-te quando o disse, não lembras? – quando estava excitada até à loucura e a convulsionar no meio de um orgasmo. – Mas obrigada por pores fim à história. Regresso aos Estados Unidos e estava a pensar em como te dizer adeus. Os homens encaram sempre a despedida de uma mulher como um golpe ao ego sexual próprio, e isso complica as coisas. Preocupava-me que se complicassem mais ainda porque és o príncipe de dois reinos e tens um ego do tamanho de ambos.

Haidar abanou a cabeça como se estivesse a receber demasiados golpes.

– Já chega!

Ela encolheu despreocupadamente os ombros.

– De acordo, vamos deixar isto. És o melhor candidato para a aventura exótica que queria ter enquanto aqui vivesse. Mas como já decidi voltar para os Estados Unidos, sabia que tinha de terminar contigo. Tenho necessidades, como tu bem sabes, e por muito bom que sejas na cama não estou disposta a esperar até que possas vir para as satisfazer. Tenho de encontrar um novo garanhão que esteja disponível com regularidade. Ou três. Mas quero-te dar um conselho: não soltes essa porcaria territorial às tuas próximas mulheres. É muito desmoralizador. E impede-me de te dizer adeus desejando-te o melhor. Agora que sei que tipo de poder pensavas que tinhas sobre mim, fiquei tão fria que não quero voltar a ver-te nunca mais nem saber nada de ti.

Viu-a dar meia volta e sair com passo tranquilo.

Em questão de segundos fechou a porta com força. Era o som da rejeição e da humilhação.

Do fundo do túnel ouviu a macabra distorção da voz de Jalal.

– Quem iria dizer? Tem mais olho do que eu pensava. Levou-te tão a sério como tu a ela. Ao que parece não me devia ter preocupado com ela.

– Com quem devias preocupar-te era contigo se te voltar a ver alguma vez.

O gémeo que mal reconhecia agora olhou-o com a mesma frialdade.

– Não te preocupes. Acho que já vai sendo hora de que desintoxique a minha vida da tua presença.

Haidar ficou a olhar para o infinito muito depois de que Jalal tivesse desaparecido.

Jalal teria de lhe ter dito que ele nunca profanaria a sua relação com aquela mulher. Roxanne teria de lhe ter dito que os seus temores eram infundados.

Aqueles que julgava mais para perto de si, o seu irmão gémeo e a sua amante, tinham-lhe virado as costas.

«Não confies em ninguém».

As palavras da sua mãe ecoaram na sua cabeça. Tinha razão. Tinha ignorado o seu sábio conselho e tinha tido de pagar um altíssimo preço por isso.

Nunca mais.