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Editados por HARLEQUIN IBÉRICA, S.A.

Núñez de Balboa, 56

28001 Madrid

 

© 2012 Harlequin Books S.A.

© 2014 Harlequin Ibérica, S.A.

Um amor difícil, n.º 27 - Março 2014

Título original: Behind Boardrooms Doors

Publicado originalmente por Harlequin Enterprises, Ltd.

 

Reservados todos os direitos de acordo com a legislação em vigor, incluindo os de reprodução, total ou parcial. Esta edição foi publicada com a autorização de Harlequin Books S.A.

Esta é uma obra de ficção. Nomes, carateres, lugares e situações são produto da imaginação do autor ou são utilizados ficticiamente, e qualquer semelhança com pessoas, vivas ou mortas, estabelecimentos de negócios (comerciais), feitos ou situações são pura coincidência.

® Harlequin, Harlequin Desejo e logótipo Harlequin são marcas registadas propriedades de Harlequin Enterprises Limited.

® e ™ são marcas registadas por Harlequin Enterprises Limited e suas filiais, utilizadas com licença. As marcas em que aparece ® estão registadas na Oficina Española de Patentes y Marcas e noutros países.

Imagem de portada utilizada com a permissão de Harlequin Enterprises Limited. Todos os direitos estão reservados.

 

I.S.B.N.: 978-84-687-5022-4

Editor responsável: Luis Pugni

 

Conversão ebook: MT Color & Diseño

Capítulo Um

 

– Pelo menos há algo de bom em tudo isto – vociferou R. J. Kincaid, estampando o telemóvel contra a mesa de reuniões.

Brooke Nichols ficou a olhar para o chefe com incredulidade. Não conseguia imaginar como aquela situação pudesse ter um lado positivo.

– O quê? – inquiriu.

Os olhos de R. J. relampejaram quando respondeu:

– É que agora sabemos que as coisas não podem ficar piores – inclinou-se para a frente no seu lugar. Os empregados presentes na reunião permaneciam imóveis como estátuas. – Tenho tentado argumentar com o promotor, com a polícia, com o senador do estado... e não tem servido de nada – levantou-se e pôs-se a caminhar ao redor da longa mesa. – A minha família está a sofrer uma autêntica perseguição e disparam-nos por todos os flancos – alto, de feições vincadas, cabelo preto e olhos cinzentos, R. J. impunha tanto como um general instruindo as suas tropas antes de entrar em combate. – E a minha mãe, Elizabeth Winthrop Kincaid, uma mulher sem mácula, vai passar a noite entre grades como uma vulgar ladra.

Soltou uma data de impropérios que fez Brooke encolher-se. Há cinco anos que trabalhava para R. J. Kincaid e nunca o tinha visto assim. Era um homem muito pacato, que jamais se alterava, que tinha sempre tempo para todos, e que via a vida de um modo despreocupado.

Claro que isso fora antes do assassinato do seu pai e de descobrir que este tinha levado uma vida dupla.

R. J. aproximou-se do seu irmão Matthew.

– Matt, tu ocupas-te de procurar novos clientes para a companhia; tens conseguido alguns nas últimas semanas?

Matthew inspirou. Os dois sabiam a resposta a essa pergunta. Até alguns dos clientes mais fiéis os tinham abandonado quando se tinha desatado o escândalo.

– Bom, temos o Larrimore.

– Pois temos. Calculo que podemos aferrar-nos a essa esperança. Greg, como vão as contas? – R. J. foi até ao diretor financeiro e por um momento Brooke julgou que o ia agarrar pelo colarinho da camisa.

Greg encolheu-se no seu lugar.

– Bom, como sabes enfrentamo-nos a certos desafios que...

– Desafios! – cortou R. J. lançando os braços ao ar num gesto dramático. – Um desafio é uma oportunidade para crescer, é aproveitar as oportunidades quando aparecem, abraçar a mudança... – afastou-se uns passos e voltou-se para a mesa. Todos estavam rígidos nos seus lugares, provavelmente rogando para que não se dirigisse a eles. – Mas o que eu vejo é uma companhia que vai a pique – passou uma mão pelo cabelo escuro. A ira endureceu-lhe as feições charmosas. – E todos vocês estão aqui a tomar notas como se estivessem numa aula do liceu. O que faz falta é que se esforcem, ora bolas! Não estão a fazer o suficiente!

Ninguém se mexeu um milímetro. Brooke, incapaz de conter-se, levantou-se. Tinha de o tirar dali quanto antes; estava a perder as estribeiras.

– Ei... R. J...

– Quê? – inquiriu ele bruscamente, virando-se para ela.

– É que preciso de falar contigo um momento; lá fora, se não te importas.

Brooke pegou no portátil e dirigiu-se à porta com o coração a martelar-lhe no peito. Com aquele humor de cão, o chefe seria capaz de a despedir no ato, mas não podia deixar que insultasse e oprimisse o resto dos empregados, que já suportavam pressão suficiente sem terem feito nada para o merecer.

– Tenho a certeza de que pode esperar – R. J. franziu a testa e apontou para a mesa de reuniões com um gesto.

Brooke deteve-se.

– É só um instante, por favor – disse-lhe, e desatou a andar de novo para a porta com a esperança de que a seguisse.

– Enfim, parece que o que a minha secretária me quer consultar é mais urgente do que o iminente colapso do Grupo Kincaid e de que a minha mãe esteja na prisão – disse R. J. nas suas costas. – E como já acabou a jornada, tenho a certeza de que todos têm coisas melhores para fazer que continuar aqui, por isso já acabámos a reunião.

R. J. chegou à porta antes que ela e segurou-lha para que saísse. Brooke foi invadida por uma onda de calor quando passou junto dele e o seu braço quase roçou o de R. J., que fechou a porta atrás de si ao sair depois dela. No meio do silêncio que reinava no corredor Brooke quase perdeu a coragem.

– Podemos falar no teu gabinete?

– Olha, Brooke, não estou para que andemos com rodeios, e mais vale que não seja uma parvoíce, porque a minha mãe está na prisão do condado, para o caso de ainda não saberes.

Brooke desdramatizou a sua atitude grosseira, atribuindo-a ao stress a que estava submetido desde o assassinato do seu pai.

– É importante, asseguro-to – o seu tom firme surpreendeu-a a ela mesma.

Quando chegaram ao gabinete de R. J. foi ela quem abriu a porta e entrou primeiro. O sol do entardecer pintava com um cálido brilho ambarino as águas do porto de Charleston, que se lobrigava através da vidraça.

R. J. entrou atrás dela e cruzou os braços.

– E então?

– Senta-te – Brooke fechou a porta com o ferrolho.

A firme determinação de Brooke fraquejou quando R. J. a olhou furibundo.

– Como?

– No sofá – acrescentou. Quase corou pela forma como tinha soado isso. Aquela era a fantasia de qualquer secretária perdidamente apaixonada como ela, mas a situação era séria. – Vou servir-te um uísque e vais bebê-lo.

R. J. não se mexeu.

– Estás louca?

– Não, mas tenho a impressão de que estás a ponto de perder os nervos e acho que precisas de te distanciar um pouco e respirar profundamente antes que faças ou digas algo do que depois acabes por te arrepender. Não podes falar aos teus empregados desse modo, sejam quais forem as circunstâncias. E agora, senta-te – disse Brooke apontando para o sofá.

Atónito, R. J. sentou-se. Brooke serviu-lhe três dedos de uísque num copo e passou-lho.

– Toma, isto vai-te acalmar os nervos.

– Os meus nervos estão perfeitamente – R. J. tomou um sorvo. – É tudo o resto que está perdido. Não posso crer que a polícia pense que a minha mãe matou o meu pai!

– Os dois sabemos que isso é impossível e eles vão perceber que é um erro.

– Achas? – R. J. arqueou uma sobrancelha e ficou a olhá-la. – E se não for assim? E se esta for só a primeira de muitas longas noites na prisão? – estremeceu e tomou um longo golo de uísque. – Está a matar-me não poder fazer nada.

– Eu sei. E aliás imagino que ainda dói demasiado a morte do teu pai.

– Não só a sua morte – R. J. desceu a vista para o chão. – Tem sido também descobrir que nos mentiu e nos ocultou coisas durante toda a vida.

R. J. e ela nunca tinham falado dos escandalosos factos que a imprensa tinha revelado depois do assassinato do seu pai, a trinta de dezembro. Já estavam em março, mas o caso ainda não se tinha resolvido.

– Outra família... – resmungou R. J. entre dentes. – Outro filho, nascido antes de mim... – abanou a cabeça. – Toda a minha vida me senti orgulhoso de ser Reginald Junior, orgulhoso de ser seu filho, seu herdeiro. A minha máxima aspiração era seguir os seus passos. Mal imaginava que os seus passos se tinham desviado até à casa de outra mulher, com quem se deitava, e com a qual formou outra família.

Nesse momento R. J. olhou-a, e Brooke sentiu uma pontada no peito ao ver a dor que se refletia no seu olhar. Não podia suportar vê-lo sofrer assim. Se pelo menos pudesse fazer alguma coisa para aliviar a sua ira e a sua pena...!

– Lamento muitíssimo – foi o que lhe saiu. Que outra coisa poderia dizer? – Tenho a certeza de que te amava. Notava-se no modo como olhava para ti – engoliu em seco. – Com certeza que teria querido que as coisas tivessem sido diferentes, ou pelo menos poder ter-to dito antes de morrer.

– Teve tempo mais do que de sobra. Tenho trinta e seis anos, pelo amor de Deus! De que estava à espera? Que fizesse cinquenta? – R. J. levantou-se com o copo na mão e pôs-se a andar para cima e para baixo enquanto continuava a falar. – Isso é o que mais me dói, que não fosse capaz de falar com confiança comigo. Depois do tempo todo que passámos juntos à pesca, na caça, a passear pelo bosque... Falávamos de tudo, mas nunca foi capaz de ser sincero comigo e me dizer que vivia envolvido em mentiras – afrouxou a gravata e desapertou o primeiro botão da camisa.

– Pois a mim parece-me que estás a fazer um grande trabalho ao manter unida a tua família e a companhia à tona.

R. J. soltou uma gargalhada áspera.

– À tona! Era irónico que uma companhia mercante não pudesse ser mantida à tona e acabasse por se afundar, não era? Mas com todos os clientes que estamos a perder acabaremos por ir ao fundo se não conseguirmos dar a volta à situação antes que acabe o ano. Por cada cliente novo que o Matthew nos conseguir, perdemos dois antigos. E o pior é que nem sequer tenho liberdade para mudar o rumo porque o meu pai, na sua infinita sabedoria, teve a genial ideia de dar ao filho ilegítimo quarenta e cinco por cento das ações da companhia e aos meus irmãos e a mim só nos deixou uns míseros nove por cento a cada um.

Brooke contraiu o rosto. Aquilo parecia efetivamente o mais cruel de tudo. R. J. tinha dedicado a sua vida inteira ao serviço do Grupo Kincaid. Tinha-se convertido no vice-diretor executivo da companhia mal tinha terminado os estudos na universidade, e todos, incluído ele, tinham interiorizado que um dia seria diretor geral e presidente. E então, de repente, quando se tinha celebrado a leitura do testamento do seu pai, descobriram que tinha praticamente deixado a companhia a um filho do qual ninguém soubera nada até então.

– Suponho que o faria porque se sentia culpado por ter mantido em segredo a existência do Jack durante todos estes anos – referiu.

– Razões não lhe faltavam para sentir culpa – resmungou R. J., detendo-se para tomar outro golo de uísque. – O problema é que parece que não parou para pensar no mal que faria ao resto com essa decisão. Nem os cinco irmãos com as nossas ações juntas podemos conseguir um voto maioritário. O restante dez por cento das ações legou-o a uma pessoa misteriosa que não conseguimos encontrar. Se Jack Sinclair conseguir comprar-lhe as ações ou votar a seu favor nas reuniões, será ele a tomar as decisões sobre o rumo da companhia, e os restantes teremos de levar com isso ou desaparecer.

– Deixarias a companhia? – Brooke não podia crer no que estava a ouvir e não pôde evitar preocupar-se nesse momento mais com a possibilidade de perder o emprego do que com R. J.

– E por que motivo ia querer ficar se me converter em mais uma roda da engrenagem? O meu pai não me preparou para isso, nem é isso que eu quero – danado, pousou o copo vazio sobre a mesa. – Talvez me vá embora de Charleston para nunca mais voltar.

– Acalma-te, R. J. – Brooke foi servir-lhe outro copo de uísque. – Ainda não se passou nada. Falta tempo até ao conselho de acionistas e até lá todos estão a contar contigo para atravessarem estas águas turbulentas.

– Adoro a tua gíria náutica – disse R. J. com um sorriso trocista enquanto pegava no copo. – Por algo te contratei.

– Por isso e pela rapidez com que escrevo.

– Pela rapidez com que escreves... ora essa! Se quisesses poderias dirigir esta companhia. Não só és organizada e eficiente; também tens jeito para as pessoas. Hoje, sem ir mais longe, conseguiste deter-me antes que perdesse as estribeiras por completo, e agradeço-te – acrescentou antes de tomar outro golo do copo.

Parecia que o uísque estava a fazer-lhe efeito: já não estava furioso, e também parecia que o seu desespero tinha amainado, pensou Brooke.

Provavelmente não era um bom momento para lhe mencionar que se tinha candidatado a um lugar de gerente na companhia e tinha sido recusada. Claro que não sabia se ele tinha estado por trás daquilo ou se estava a par sequer.

– Estamos todos muito tensos e agora, mais do que nunca, temos de nos manter unidos e trabalhar juntos para sair do fundo – respondeu passando uma mão pelo cabelo. – Pensei que o último que querias seria que um dos teus principais empregados se demitisse, porque isso só pioraria as coisas.

– Tens razão, como sempre, minha linda Brooke.

Ela olhou-o com os olhos esbugalhados. Era óbvio que o uísque lhe estava a subir à cabeça, mas não pôde evitar que uma rajada de calor lhe aflorasse ao ventre ao ouvir essas palavras.

– O mais importante neste momento é que encontrem o assassino do teu pai – disse tentando distrair-se do ardente olhar de R. J. – Assim a tua mãe deixará de estar sob suspeita.

– Contratei um detetive privado – comentou R. J. descendo a vista para o copo. – Disse-lhe que lhe pagarei vinte e quatro horas por dia e que não cesse até encontrar a verdade – alçou de novo a vista para ela. – E, logicamente, pedi-lhe que comece por investigar os irmãos Sinclair.

Brooke assentiu. Jack Sinclair parecia o tipo de homem ansioso por vingar-se por ter sido o filho bastardo e não ter sido reconhecido durante todos esses anos. Claro que talvez a opinião dele estivesse influenciada pela injustiça que Reginald Kincaid tinha cometido com o filho R. J. no testamento. Não conhecia nem Jack nem Alan, seu meio-irmão.

– Devem estar aborrecidos por o teu pai os ter mantido em segredo todos estes anos.

– Sim, sem dúvida devem estar ressentidos – R. J. voltou a sentar-se no sofá. – Estou a começar a senti-lo na minha própria carne. E suspeito que a minha mãe também, embora às vezes me pergunte se não o saberia já – acrescentou abanando a cabeça. – Não pareceu tão chocada como o resto de nós ao descobrir que o meu pai tinha outra família.

Brooke engoliu em seco. Se tinha tido conhecimento da infidelidade do seu marido, estava claro que Elizabeth Kincaid teria tido motivos para o assassinato. E tinha sido vista no edifício de escritórios do Grupo Kincaid, na noite do assassinato. Desviou aquele pensamento da sua mente. Era impossível que uma mulher tão encantadora como aquela pudesse disparar contra outro ser humano, ainda que fosse um marido que a enganava.

– Deixa que te sirva mais um pouco – disse inclinando-se para lhe encher o copo.

O líquido agitou-se com violência no interior da garrafa quando de repente o forte braço dele a enlaçou pela cintura e a fez sentar ao seu lado no sofá. Brooke deixou escapar um gritinho.

– Obrigado, Brooke. Suponho que precisava de desabafar e falar de tudo isto com alguém.

O braço de R. J. rodeou-lhe de repente os ombros. Brooke mal podia respirar e cada vez que inspirava o cheiro da sua colónia fazia-a sentir-se zonza e os batimentos do seu coração aceleravam-se.

R. J. arrebatou-lhe a garrafa e pô-la no chão junto com o seu copo. Depois pousou-lhe a mão na coxa e Brooke notou a sua calidez inclusive através do tecido da saia. O coração parecia que lhe ia sair do peito quando R. J. se virou para ela e a encarou fixamente.

– Nunca tinha reparado que os teus olhos eram tão verdes.

Brooke conteve-se para não os arregalar. Com quantas mulheres teria utilizado essa frase?

– Há quem pense que são pardos.

– Pois estão enganados – respondeu ele muito sério. – Claro que ultimamente estou a começar a perceber que as pessoas se enganam com frequência – pousou a vista nos lábios de Brooke, que se entreabriram de forma inconsciente antes de ela os voltar a fechar. – E eu próprio estou a começar a questionar muitas das minhas convicções.

– Às vezes isso é bom – respondeu ela num tom baixo.

Estar sentada tão perto de R. J. era um perigo, pensou, sentindo um formigueiro a percorrer-lhe o corpo.

– Calculo – R. J. franziu a testa, – mas isso não faz com que a vida seja mais fácil.

– Às vezes os desafios fazem-nos mais fortes – murmurou ela.

Afigurava-se difícil articular pensamentos coerentes com um braço de R. J. a rodear-lhe os ombros e a mão do outro no joelho. Uma parte dela queria fugir, mas a outra morria por lhe deitar os braços ao pescoço e...

De repente, os lábios de R. J. tomaram os seus com um beijo ardente com cheiro a uísque que fez com que qualquer pensamento abandonasse a sua mente nesse instante. Brooke derreteu-se contra ele e deixou que as suas mãos subissem e descessem pela camisa de R. J., deleitando-se na firmeza dos músculos que se ocultavam por baixo dela.

As mãos dele por sua vez acariciavam-lhe as costas, provocando-lhe um delicioso formigueiro na pele. Os mamilos endureceram-se-lhe e uma intensa onda de calor aflorou ao seu ventre.

Sentindo a ânsia de R. J., respondeu ao beijo com idêntica intensidade. Queria aliviar a sua dor, fazer com que se sentisse melhor. Os segundos passavam, e o beijo tornou-se tão ardente que Brooke estava a começar a pensar que se iam fundir num só quando R. J. despegou suavemente os lábios dos dela e se chegou para trás.

– És uma mulher incrível – disse-lhe com um suspiro.

O coração de Brooke palpitou com força e perguntou-se se aquele poderia ser o começo de uma nova fase na sua relação. Ou talvez estivesse a deixar voar demasiado a imaginação; e doravante recordaria aquele momento como o momento em que tinha destruído a carreira que com tanto esforço tinha construído no Grupo Kincaid por embebedar o chefe e pôr em perigo a sua relação profissional. Uma sensação de pânico apoderou-se dela.

Quando R. J. lhe acariciou a face, teve de lutar contra um repentino impulso de esfregar a sua cara contra a mão dele, como um gato mimoso. Mas a coisa não terminou aí; a mão de R. J. desceu pelo seu pescoço, roçou a curva de um seio e desceu lentamente até à coxa.

Voltou a prender os seus lábios de novo.

A sua roupa cheirava a fumo, e juntamente com o cheiro do uísque e o cheiro da sua colónia a mistura era embriagadora.

Se pudesse teria permanecido assim durante horas, com os braços em torno do seu pescoço enquanto se rendia ao assalto dos seus lábios, mas então R. J. voltou a afastar-se, deixando-a insatisfeita, e franziu a testa e passou uma mão pelo cabelo, como quem se pergunta o que estava a fazer.

De novo as dúvidas invadiram Brooke, como um dedo gelado a deslizar-lhe pelas costas. Talvez o cheiro a fumo não fosse de tabaco, mas da sua carreira e da sua reputação chamuscadas por um momento de fraqueza.

O instinto empurrou-a a pôr-se de pé, o que não foi simples, com o que lhe tremiam os joelhos.

– Talvez devêssemos ir andando. Já passa das sete – disse.

R. J. deitou a cabeça para trás, apoiando-a nas costas do sofá, e fechou os olhos.

– Estou de rastos; duvido que possa dar um único passo.

– Vou pedir um táxi – propôs Brooke, que não queria que conduzisse com o que tinha bebido.

R. J. não vivia longe, mas não lhe parecia que fosse uma boa ideia acompanhá-lo a pé nem levá-lo no seu carro. Porque se a convidasse para entrar, não tinha a certeza de ser capaz de recusar, e sabia que se isso sucedesse se arrependeria depois de ter ficado a parecer uma mulher fácil.

– Não te preocupes comigo, Brooke. Durmo aqui, no sofá. Fi-lo um monte de vezes. E se acordar a meio da noite e não puder voltar a adormecer, posso sempre atacar todo o trabalho que tenho pendente.

– Mas esse sofá é incomodíssimo; amanhã vai-te doer tudo.

– Eu fico bem, não te preocupes – reiterou ele, que já estava a deitar-se. – Vai para casa e descansa; vemo-nos amanhã de manhã.

Brooke mordeu o lábio. De certo modo doía-lhe que a despachasse daquela maneira depois dos ardentes beijos que tinham partilhado. Mas o que esperava? Que a pedisse em casamento? Provavelmente com tanto uísque até se tinha esquecido de que a tinha beijado.

– E não vais jantar nada?

– Não tenho fome – murmurou ele.

– No frigorífico da cozinha há um tabuleiro com sandes que sobraram da reunião desta manhã. Se quiseres posso trazer-tas.

– Deixa de tratar-me como se fosses minha mãe e vai para casa – respondeu-lhe ele num tom quase abrupto, entrelaçando as mãos por baixo da nuca e fechando os olhos.

Brooke engoliu em seco e ia virar-se para a porta quando o ouviu dizer num tom baixo:

– Não posso crer que a minha mãe esteja na prisão. Nunca me tinha sentido tão impotente em toda a minha vida.

Brooke voltou para junto dele.

– É uma mulher forte e vai sair desta. Tu estás a fazer tudo o que podes, e não a ajudará em nada se acabares por adoecer por causa do stress e da preocupação. Dorme um pouco; amanhã a companhia precisa de ti em pleno rendimento.

R. J., que tinha aberto os olhos e estava a olhá-la, exalou um pesado suspiro.

– Tens razão, Brooke, como sempre. Obrigado por tudo.

Mal tinha dito isso quando voltou a fechar os olhos. Brooke sentiu uma pontada de ternura no peito ao olhá-lo. Tão orgulhoso e tão forte, e ao mesmo tempo tão impotente e desesperado por não poder evitar à mãe o mau momento pelo qual estava a passar...

Saiu do seu gabinete, fechando a porta depois de si, pegando no casaco e na mala.

– Até amanhã, Brooke!

Ao ouvir o seu nome deu um salto. Tinha-se esquecido por completo que ainda podia estar algum outro funcionário na empresa. Normalmente a essa hora já todos tinham saído, mas estava ali Lucinda, outra secretária, a vestir o casaco duas mesas mais à frente.

Brooke perguntou-se se tinha as faces vermelhas ou os lábios inchados. Sem dúvida algo nela delataria que tinha estado aos beijos ao chefe.

– Adeus, Lucinda! – respondeu.

Apressou-se para o elevador na esperança de não se encontrar com mais ninguém, mas quando as portas se abriram deparou com Joe, do departamento de marketing.

– Que dia, hã?! – comentou este com um suspiro quando entrou. – Daqui a pouco isto vai acabar por rebentar por algum lado.

– Não é verdade – replicou ela indignada. – Estamos a passar por um momento difícil, mas esquecer-se-á o que se passou e a companhia voltará a estar onde sempre esteve: entre as melhores.

Joe arqueou uma sobrancelha.

– Achas? Se é verdade que a velha senhora Kincaid é culpada, duvido que a reputação da família se recupere deste golpe.

– Ela não o matou – replicou ela com firmeza. – E não andes por aí a difundir o rumor de que foi ela que o fez. Só vais piorar as coisas.

– E se fizer? Vais fazer queixinhas ao chefe? – questionou Joe com cólera.

– Não. Já tem problemas que cheguem. O que precisa neste momento é do nosso apoio.

– Pareces esposa dele: tão atenta às suas necessidades, dando-lhe sempre o teu apoio incondicional... – observou ele com um sorriso trocista. – Sorte a dele!

Brooke ficou rígida. Intuiria que se tinha passado algo entre eles? As portas abriram-se nesse momento e respirou aliviada.

– Não sou esposa dele – respondeu-lhe antes de sair do elevador.

Ainda que um dia talvez fosse, pensou enquanto se dirigia para a saída. A sua mente já estava a urdir fantasias perigosas, sonhos que lhe podiam explodir na cara e destruir a sua carreira e reputação.

Mas que difícil era não deixar voar a imaginação!