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Editados por HARLEQUIN IBÉRICA, S.A.

© 2010 Christine Rimmer. Todos os direitos reservados.

UNIÃO SEM AMOR, N.º 1295 - Janeiro 2012

Título original: Valentine Bride

Publicado originalmente por Silhouette® Books.

Publicado em portugués em 2011

Todos os direitos, incluindo os de reprodução total ou parcial, são reservados. Esta edição foi publicada com a autorização de Harlequin Enterprises II BV.

Todas as personagens deste livro são fictícias. Qualquer semelhança com alguma pessoa, viva ou morta, é pura coincidência.

® Harlequin, logotipo Harlequin e Bianca são marcas registadas por Harlequin Books S.A.

® e ™ São marcas registadas pela Harlequin Enterprises Limited e suas filiais, utilizadas com licença. As marcas que têm ® estão registadas na Oficina Española de Patentes y Marcas e noutros países.

I.S.B.N.: 978-84-9010-652-5

Editor responsável: Luis Pugni

ePub: Publidisa

Capítulo 1

Caleb Bravo estava de pé à porta do quarto da sua governanta. Tinha na mão o bilhete que ela deixara na bancada da cozinha.

– O que demónios é isto, Irina? – abanou o papel no ar.

– Olá, Caleb! Chegaste cedo – disse, sem olhar para ele, enquanto punha uma camisola cinzenta numa de duas das malas que abrira em cima da cama.

– Perguntei-te o que estás a fazer – entrou no quarto.

– Vou-me embora – ergueu-se e olhou para ele.

– Assim, sem mais nem menos? Sem lugar para onde ir?

– Não tenho outra escolha.

– É claro que tens – abanou novamente o bilhete. –Só três frases – acusou-a ele. – «Caleb, tenho de ir. Não volto. Obrigada por tudo o que fizeste por mim» – amarrotou o bilhete e atirou-o para o caixote do lixo que havia num canto. – Podes pelo menos dizer-me porquê?

Virou-se e pegou num envelope que havia na mesa-de-cabeceira.

– Isto chegou pelo correio há uma hora – entregou-lhe o envelope.

Lá dentro só havia uma folha de papel, uma carta de aspecto oficial com o cabeçalho do Serviço de Imigração e Cidadania dos Estados Unidos. Revogavam a sua concessão de asilo político. Tinha de se apresentar em Santo António imediatamente.

– O que demónios é isto? – repetiu. – Não tens cartão de residência? Não serviu durante todos estes anos?

– Tenho licença de trabalho e pedi a residência, mas há… atrasos. Muitos atrasos.

– Não podem fazer isto, não podem mandar-te de volta para a Argóvia.

– Mas é verdade – tirou-lhe a carta, voltou a dobrá-la e pô-la no envelope.

Deixou o envelope na mesa-de-cabeceira e continuou a fazer as malas. Olhou para ela enquanto se mexia em silêncio do armário para a cama e de volta ao armário.

Aquilo não estava a acontecer, não podia estar a acontecer.

Não conseguiria sobreviver sem Irina. Era a melhor. Arrumava o que ele desarrumava, ocupava-se da sua roupa, cozinhava pratos saborosos quando lhe pedia… E nem sequer mexia uma pestana quando o via a ele ou a alguma namorada a andar pela casa nus.

Era a governanta perfeita. Silenciosa, competente e sempre tranquila. Antecipava-se a todas as suas necessidades e conseguia ser quase invisível. Nunca encontraria outra como ela.

E Victor?

O primo dela, Victor Lukovic era o seu melhor ami go. Devia a vida a Victor. Não conseguiria suportar se Victor pensasse que expulsara a sua prima mais nova.

– Irina…

– Sim?

– Para onde vais?

Ela franziu o sobrolho e abanou a cabeça. Depois, voltou para o armário para ir buscar uma pilha de roupa interior de algodão branco deprimente.

– Então… vais voltar para a Argóvia?

– Nunca mais voltarei para lá – pôs a roupa interior na mala maior e fechou-a.

– Mas se não vais para lá, então…

– Não precisas de saber – pegou num computador portátil que comprara poucos meses depois de começar a trabalhar para ele e pô-lo num bolso da mala pequena.

Fechou também essa mala e pô-la no chão, atrás da grande.

– Sabes para onde vais?

Não houve resposta. Pôs as malas ao lado uma da outra com um pequeno espaço entre elas, depois parou nesse espaço e olhou para ele.

– Obrigada por tudo o que fizeste por mim, Caleb. És um bom chefe. O melhor – como sempre, estava vestida dos pés à cabeça de cinzento.

Nunca a vira com nenhuma outra cor. Também nunca a vira de manga curta. E usava sempre blusas e camisolas de gola alta, desafiando por completo o Verão agreste de Santo António. Parecia tão… triste. Perdida. E sozinha.

– Telefonaste a Victor para lhe contar? – perguntou ele.

– Não. O meu primo já fez muito por mim. Não precisa de mais um problema.

– Irina, vá lá… – sem pensar, agarrou-a.

Ela escapou da sua mão e recuou.

– Por favor, tenho de ir.

Má ideia, não gostava que lhe tocassem.

– Lamento, não queria…

– Não fizeste nada de mal – disse, tranquila, enquanto agarrava nas duas malas. – Por favor, deixa-me passar.

– Vá lá. Dá-me um pouco de tempo, está bem? Antes de… desapareceres. Ninguém virá buscar-te nos próximos dez minutos.

Pousou as malas e murmurou alguma coisa na sua língua. Baixou a cabeça e depois levantou o olhar.

– Oh, Caleb…

– Que mal pode fazer-te? – ele sorriu. – Alguns minutos para falar…

– Para quê? É inútil…

– Irina, por favor – olhou para ela intensamente.

– Está bem, fala.

– Não consigo acreditar que te ias embora assim e deixar-me preocupado e a perguntar-me o que teria acontecido. Se não tivesse chegado cedo… – abanou a cabeça, incrédulo. – Ias-te embora sem mais nem menos, não ias?

– Sim. Já acabámos a conversa?

A ideia brilhante desenhou-se na sua mente naquele momento enquanto olhava para ela de pé, triste e perdida entre as duas malas. Sabia o que fazer.

– Casar-nos-emos – disse ele. – É a solução perfeita.

Ela não disse nada, limitou-se a olhar para ele em silêncio no meio das duas malas.

Tinha de a afastar das malas.

– Vamos – fez um gesto por cima do ombro. – Vamos para a sala. Vamos sentar-nos, beber alguma coisa. Vamos falar. Pensaremos juntos.

Ela continuou ali de pé em silêncio entre as suas malas, olhando para ele com uma expressão que não dizia nada.

– Para a sala? – repetiu ele, quase receando tê-la assustado e que atirasse as malas pela janela e saltasse atrás.

Houve outro longo silêncio e, então, quando estava prestes a perder as esperanças, disse:

– Está bem. Vamos falar.

– Óptimo! – exclamou ele. – Fantástico! – virou-se e ela seguiu-o sem fazer barulho. Na sala, apoiou-se numa poltrona de couro. – Alguma coisa para beber? – perguntou, num tom alegre.

– Não, obrigada – disse ela e fez uma careta. Portanto, ele sentou-se na poltrona a poucos metros dela e tornou a sua expressão mais sincera.

– Irina, não posso perder-te. És demasiado boa no que fazes. Nunca conseguiria substituir-te. É simplesmente impossível.

Estranho. Passara dois anos a trabalhar para ele. A questão de não poder tocar nela nunca fora um problema antes, mas naquele momento era irritante. Se pudesse tocar nela, saberia que a convenceria. Mas ele estava numa poltrona e ela estava noutra e, dado que o contacto físico estava descartado, decidiu que teria de conseguir chegar ao coração dela. Por sorte, era um mestre nisso. Ganhava a vida assim, afinal de contas.

– Tens de admitir. Damo-nos muito bem. Não tenho queixas, e tu?

Engoliu em seco e abanou a cabeça, a longa franja mexeu-se como um véu sobre os seus grandes olhos.

– Além disso, há Victor, Irina. O que digo a Victor se não resolvermos isto? Não consigo acreditar que te ias embora sem lhe dizer.

– Não… posso dizer-lhe. Tem família aqui. Já fez muito por mim. É melhor não o envolver.

– Devo-lhe a vida – disse Caleb, com um toque dramático.

Ou, pelo menos, era o que ele pensava, até se aperceber de que ela tentava não sorrir.

– Não devias conduzir tão depressa.

Sim, era verdade, gostava de conduzir depressa, sempre gostara. Quando ainda estavam em Utah, Victor tirara-o de um carro em chamas depois de ele ter perdido o controlo e ter chocado contra uma parede. Ainda se arrependia de ter destruído esse carro. Um Mustang de 68 que restaurara no liceu com um pouco de ajuda do seu irmão Jericho.

– Isto não tem nada a ver com a condução – disse-lhe, num tom severo e de recriminação. – Isto tem a ver contigo e comigo e com o pobre Victor, que vai ficar mais do que alucinado se te fores embora da minha casa e desapareceres. Isto tem a ver com precisares de permitir que faça isto por ti e pelo homem que salvou a minha vida.

Irina olhava para ele com uma expressão indecifrável. Finalmente, disse, com calma:

– Queres casar-te comigo para não teres de te casar com essa tal Emily.

Apanhado. Sim, claro. Afastar Emily Gray seria um benefício extra. De todos os modos, em que estava a pensar para ir para a cama com uma colega? Nunca devia tê-lo feito. Mas era um problema que tinha com as mulheres. Como podia resistir? Cheiravam tão bem e tinham uma pele tão suave…

Pigarreou.

– Irina, sabes que não ia casar-me com Emily.

– O problema é que Emily não sabe.

Era verdade. Na noite anterior, Emily seguira-o pela casa dizendo: «Tiquetaque, tiquetaque…» Era o som do seu relógio biológico. Queria uma aliança e um bebé antes dos trinta e cinco anos. Ele só queria afastá-la. Mas Emily era uma mulher de ideias fixas e não aceitava que ele não era o seu homem.

Voltou para Irina e para os seus problemas com a Imigração. Esboçou o melhor dos seus sorrisos.

– Bom, depois de nos casarmos, Emily perceberá tudo com clareza.

Houve um silêncio enervante. Irina continuava a olhar para ele com as mãos unidas no colo. Ele manteve a boca fechada à espera que acedesse a casar-se com ele, reconhecendo que era útil para os dois. Mas ela não dizia nada. Quando não conseguiu suportar o silêncio por mais tempo, disse:

– Olha, podemos esquecer-nos de Emily, por favor?

Ela limitou-se a assentir em silêncio.

– Combinado – disse, com confiança. – Iremos a Las Vegas amanhã e casar-nos-emos no dia de São Valentim. Na semana que vem poderás ir à Imigração com uma certidão de casamento na mão.

– Não entendes.

– Entender o quê?

– Conseguir uma licença de residência por casamento não é tão fácil como parece nos filmes da televisão. O teu governo é muito… – franziu o sobrolho à procura da palavra, – rígido e certifica-se de que o casamento é real. Haverá reuniões, compreendes? Reuniões com os oficiais da Imigração. E quem trata do caso pode aparecer aqui a qualquer momento sem avisar e provar que mentimos.

– Oh, vá lá, é uma agência do governo. Aposto o meu Audi R8 em como não têm pessoal suficiente para andar a visitar as pessoas de modo aleatório.

– Não é aleatório. E tens razão, as visitas em casa não são frequentes. Mas acontecem, Caleb. Se não pensarem que o casamento é real e conseguirem provar que mentimos, será muito mau.

– Quer dizer que te deportarão?

– Pior. É um crime casar-se falsamente para conseguir a residência. Se descobrirem, ambos pagaremos grandes multas e iremos para a prisão. E quando me soltarem, deportar-me-ão e depois nunca terei a oportunidade de conseguir a residência.

Aquilo começava a parecer um desafio. Ele sempre desfrutara dos desafios.

– Podemos fazê-lo. Conseguimos convencê-los. Sou muito convincente quando quero.

– Há mais.

– O que queres dizer com mais?

– O casamento tem de durar pelo menos dois anos. Aquelas palavras deixaram-no mudo durante alguns segundos.

– Não falas a sério…

– Sim. Dois anos. Queres estar casado com a tua governanta durante dois anos?

– Dois anos… – a verdade era que não queria. – Isso não pode ser. Tens a certeza?

– Sim.

– Parece-me um pouco… exagerado.

– Bom, se pensares bem, um casamento real dura até à morte – estalou os dedos. – Dois anos não são nada. Mas para a Imigração serve para acreditarem que o casamento foi de boa-fé.

– Parece-me demasiado.

Irina levantou-se tão depressa que o assustou.

– Ena! Irina… O que foi?

– Vou trazer-te o livro.

– Que livro?

– O Manual de Imigração dos Estados Unidos. Há muitas coisas sobre a residência via casamento. Vou mostrar-te as páginas que explicam a duração de dois anos e as penas por casamento falso – mexeu-se. – Achas que sou tola? Achas que não considero todas as opções que há para ficar neste país? Sou muitas coisas, Caleb Bravo, mas não tola.

– Está bem – juntou as mãos. – Acredito. Não preciso de ver o livro.

– De certeza?

– De certeza. Volta a sentar-te.

Sentou-se na beira da poltrona e olhou para ele com os olhos semicerrados.

– Estás zangada? – tentou recordar se a vira zangada alguma vez.

– Devias saber que nunca te minto. Juro-o. Se não me tivesses dado este trabalho, ainda estaria na Argóvia.

– Irina, acredito em ti, está bem?

– Sim, está bem – a sua expressão suavizou-se.

Dois anos. Dava medo. Ele tinha pensado em alguns meses. Ela conseguiria os seus papéis e depois poderiam divorciar-se e voltar à sua vida normal.

Mas, claro, com um visto de residência permanente talvez decidisse parar de trabalhar para ele.

Bom, ocupar-se-ia disso quando chegasse o momento. Acontecesse o que acontecesse depois, queria ajudá-la. Além disso, havia o benefício de se livrar de Emily. E faria boa figura com Victor, que lhe confiara a sua linda prima.

– Vai correr tudo bem – disse ele. – Casar-nos-emos e assim continuaremos durante esses dois malditos anos se tiver de ser.

Ela cruzou os braços num gesto que falou de autoprotecção.

– Há outro problema – disse ela, baixando a cabeça.

– Que outro problema?

– Tu, Caleb. Tu és o problema.

– Bom, na verdade, estou a tentar ser a solução.

– Mas… És um problema.

– Como é possível?

– Sempre com todas essas mulheres… – fez um gesto com a mão.

O que podia dizer? Gostava de mulheres.

– Sim, e?

– Se estivermos casados, enquanto estivermos casados, terá de ser um casamento real.

– Sim…

– Não é só uma exigência da Imigração, é uma exigência minha.

– Tua? – pestanejou.

– Sim – assentiu. – Tem de ser… Como se diz? Real. Temos de o fazer sinceramente. É a única forma de me parecer correcto, a única forma de ser real para a Imigração. Embora não seja um casamento por amor, será honesto. Sei que isto não é fácil para um homem como tu.

Não sabia o que ela estava a dizer, mas não parecia lisonjeador.

– O que quer dizeres com um homem como eu?

– Sabes… – encolheu os ombros e fez um gesto com as mãos.

– Superficial… Estás a chamar-me superficial?

– Mas de bom coração – levou as mãos ao peito.

– Obrigado… Porque começo a ter a sensação de que tu já tinhas pensado nisto?

– Porque é assim – voltou a encolher os ombros. – Pensei em… todas as formas possíveis. Sempre soube que, se tivesse problemas, tu pensarias em casar-te comigo para eu obter os papéis. Há dois anos que trabalho para ti. Sei como funciona a tua cabeça – apontou para a cabeça com o indicador. – Portanto, penso em tudo, pelo sim pelo não. Pensei no que preciso de ti para aceitar casar-me contigo. Pensei… Como se diz? Nas minhas condições.

– Ofereço-me para te salvar a pele e tens condições?

– Sim. Enquanto estiveres casado comigo renunciarás às mulheres.

Renunciar às mulheres… Dois anos sem sexo? Impossível.

– Vá lá, sou um homem. Um homem com… necessidades.

– Sim – disse, tranquila. – Eu sei.

Então, tencionava ir para a cama com ele? Isso era difícil de imaginar. Gostava de mulheres. De todas as mulheres. Mas nunca, desde que Irina vivia em sua casa, pensara em ir para a cama com ela. Até àquele momento. E agora que pensava nisso, não sabia o que pensar. Parecia-lhe… mau, de certo modo.

Mas ela era uma mulher e ele era um homem. E estariam legalmente casados. Porque não, se fosse a única mulher disponível?

– Estás a dizer que queres que seja um casamento real em todos os sentidos?

– Não, estou a dizer que pode… fazer a tua satisfação.

«Isto não é real, não estamos a ter esta conversa», pensou, mas era real.

– Queres dizer, satisfazer-me?

– Sim, isso.

Impossível! Se ela tinha condições, ele também.

– Olha… odeio dar-te razão, mas é assim. Entendo o teu ponto de vista. Se temos de convencer a Imigração de que o casamento é real, não podem ver-me a sair com outras mulheres. Portanto, acedo a renunciar às mulheres.

Pensou que ela ia começar a chorar.

– Obrigada, Caleb.

– Não me agradeças. Porque tu terás de me ajudar. Não vou estar dois anos sem uma mulher na minha cama.

A gratidão desapareceu e a sua expressão não era muito lisonjeadora. Estava pálida à volta da boca e os seus olhos pareciam mais angustiados do que o usual. Mas disse, num tom razoável:

– Não saltarei para dentro dos lençóis.

– Queres dizer que não irás para a cama comigo?

– Sim. Não podemos. Devo ter… tempo.

– Tempo.

– Para… te conhecer melhor do modo como uma mulher conhece o homem com quem se casa. Um mês. Por favor. Consegues aguentar um mês?

Aguentar? Podia ter-se rido. Ou ter-lhe dito para o esquecer, que era impossível. Claramente, não queria ter nada a ver com ele na cama… E não se sentia excitada com a ideia de mudar de opinião.

Nunca saíra com ninguém, pelo menos, que ele soubesse. E teria descoberto se o tivesse feito? Sim, podia ser inconsciente algumas vezes. Habituara-se a prestar-lhe pouca atenção. Aumentava-lhe o salário todos os anos e dava-lhe um pagamento extra no Natal. E de vez enquanto, dizia-lhe que apreciava o grande trabalho que fazia para ele.

Durante a maior parte do tempo, esquecia-se de que existia e ela parecia estar confortável assim, mas também não era assim tão inconsciente. Viviam na mesma casa, afinal de contas. Teria percebido se tivesse um namorado.

Seria virgem? Não sabia se estava pronto para se relacionar com uma virgem. Tivera uma namorada virgem quando começara a universidade. Uma fora mais do que o suficiente. Da primeira vez que tinham feito amor sangrara e depois chorara durante horas. Depois de uma experiência tão desagradável, renegara as inocentes. Não queria confusões.

Mas não ia deixar Irina sair pela porta com as suas velhas malas para não voltar a vê-la. Talvez não devesse preocupar-se tão cedo.

– E se dançarmos conforme a música?

– Música? – perguntou.

– É uma expressão idiomática. Quer dizer que será melhor não marcarmos nenhum prazo fixo, para além dos dois anos de casamento obrigatório. Finalmente, bom, isto… talvez possamos ir para a cama. Mas não antes de te sentires preparada.

– Talvez nunca me sinta preparada.

– Irina?

– Sim, Caleb.

– Esquece o sexo.

– Mas disseste que…

– Pára. Ouve. Só temos… De ir amanhã para Las Vegas, dar o nó e ver como correm as coisas.

– Sei o que significa isso – disse, contente. – «Dar o nó» é casar-se.

– Muito bem. Casar-nos-emos e renunciarei às restantes mulheres. E não te pressionarei em nada relacionado com o sexo. Não tens de te preocupar com isso, está bem? Esperaremos e veremos.

Capítulo 2

– Repita comigo – disse o homem, chamado padre Ted, num tom de voz profundo que fazia lembrar o próprio Deus. – Eu, Irina, aceito-te, Caleb.

Levantou o olhar para olhar para Caleb nos olhos.

– Eu, Irina, aceito-te, Caleb.

– Como marido…

– Como marido.

– Diante destas testemunhas e prometo…

– Diante destas testemunhas e prometo… – repetiu o resto, – amar-te e respeitar-te para o resto das nossas vidas. Aceito-te, Caleb, com todos os teus defeitos e virtudes como me ofereço a ti com todos os meus defeitos e virtudes. Ajudar-te-ei quando precisares de ajuda e recorrerei a ti quando for eu a precisar. Prometo cumpri-lo até que a morte nos separe.

O padre Ted virou-se para Caleb.

– Repita comigo…

E Caleb repetiu as mesmas frases que Irina pronunciara. Foi tudo muito grave e solene. Irina tentou não se sentir culpada por aquilo não ser real. Rogou em silêncio que Deus a perdoasse pelas suas mentiras, mas depois pensou que não era mentira, que a maioria era real. Só as partes referidas ao amor é que eram falsas. Durante os dois anos seguintes, estariam tão casados como duas pessoas quaisquer que pensassem em passar o resto das suas vidas juntas. Só que sem amor. E, enquanto ela conseguisse evitá-lo, sem sexo.

Nem amor, nem sexo, nem para sempre. Ou seja, não estavam realmente casados.

Sorriu interiormente. Estava a rezar a Deus? Se ela não rezava, não desde que se apercebera de que, se havia um Deus, a traíra.

– A aliança – disse o padre Ted.

O seu primo Victor, enorme e bonito no seu smoking preto, tirou um anel. Deu-o a Caleb que procurou a mão dela. Preparara-se para aquilo, sabia que teria de tocar nela. Sentiu os dedos que se fechavam sobre os dela e o pânico assaltou-a, recordou-se que era Caleb, que nunca a magoara, que sempre fora bom com ela.

O pânico cessou. Deixou escapar o ar que retivera nos pulmões enquanto o anel deslizava no seu dedo. O diamante, grande e brilhante, resplendeceu na sua mão. Parecia irreal: o vestido branco e comprido de gola alta que vestia, a aliança, a capela de Las Vegas, com as suas paredes pintadas e as colunas douradas que ladeavam o altar. Até o homem que estava a casá-los e que se fazia chamar padre Ted. Parecia-se suspeitosamente com um actor de Hollywood com a sua cabeça grisalha e os olhos demasiado azuis.

Olhou para o rosto do seu marido. Ele sorriu e retribuiu um sorriso trémulo.

– Pode beijar a noiva.

Também se preparara para aquilo. Uma mão de Caleb tocou-lhe num braço e nos seus olhos viu uma pergunta. Quase conseguiu ouvi-lo a perguntar se estava preparada para lhe dar um beijo. Ela fez um assentimento minúsculo e ele inclinou-se para a beijar. Não foi mau. Fechou os olhos e tentou controlar a respiração, recordando-se outra vez que era Caleb, que sempre a tratara com respeito, com generosidade e amabilidade.

Um segundo depois, ele levantou a cabeça. As suas mãos ainda seguravam os braços dela, ligeiramente, com suavidade. Tinha consciência do seu calor, do seu cheiro, nem azedo, nem sujo, mas fresco e limpo. E deixou-o continuar.

– Apresento-vos o casal Bravo.

Viraram-se para a família sentada nos bancos. Do lado de Caleb estavam os seus pais e a sua irmã, Elena. Ninguém da família extensa pudera ir devido ao facto de o casamento ter sido tão repentino.

Irina surpreendera-se por a família ter aceitado tão bem que Caleb e ela se casassem, sobretudo Davis, o pai. Ouvira Caleb falar com cansaço do seu pai mais de uma vez. Davis queria que os seus filhos se casassem com mulheres de famílias ricas e poderosas. Anteriormente, quando os seus filhos tinham escolhido mulheres de que não gostava, deixara o seu desprazer claro. Mas daquela vez não. Daquela vez não se opusera quando Caleb dissera que ia casar-se com a sua governanta, pelo menos, ela não ouvira nada.

Para além dos pais e de Elena, estavam presentes uns primos de Las Vegas, Aaron e Fletcher e as suas esposas, Celia e Cleo com os seus filhos mais velhos. Os bebés tinham ficado em casa com as suas amas.

Do lado da noiva, estava Victor com a sua esposa, Maddy Liz, e os seus dois filhos. Miranda e Steven. Miranda, que tinha seis anos, gritou, contente:

– Hurra, tia Irina! – e começou a aplaudir.

O seu irmão de quatro anos seguiu-a, depois o resto das crianças e, finalmente, todos os assistentes.

Caleb rodeou-a com um braço. Não se preparara para aquilo, mas aceitou-o. A sua mão era quente e firme na cintura dela. Ele sorriu e ela retribuiu o sorriso enquanto todos aplaudiam.

Ouviu-se a música gravada e Caleb ofereceu-lhe o braço. Desceram do altar e saíram para o sol fraco da tarde de Fevereiro.

A mulher que ajudara o padre Ted esperava por eles. Guiou-os até um jardim com um lago e um caramanchão. Tiraram-lhes muitas fotografias a sós e com a família.

Depois das fotografias, enquanto começava a escurecer, entraram numa limusina e voltaram para os hotéis gémeos, High Sierra e Impresario, onde tinham passado a noite anterior. A família de Las Vegas estava no negócio do jogo, explicara-lhe Caleb. Aaron era o chefe do High Sierra e Fletcher era o conselheiro do Impresario. Ambos viviam com as suas famílias nas águas-furtadas dos edifícios.

Não havia muita distância. Irina sentou-se ao lado do seu marido, só os dois na sua limusina privada. Ficaram um instante em silêncio. Ela olhava pela janela a ver passar as palmeiras altas que ladeavam a rua. Ao seu lado, Caleb mexeu-se ligeiramente no banco de couro. Ela virou-se e viu que ele olhava para ela com um sorriso. Os seus olhares encontraram-se.

– Correu bem – disse, contente.