Editados por HARLEQUIN IBÉRICA, S.A.

© 2011 Michelle Reid. Todos os direitos reservados.

LEGADO DE PAIXÕES, N.º 1374 - Abril 2012

Título original: The Kanellis Scandal

Publicado originalmente por Mills & Boon®, Ltd., Londres.

Publicado em portugués em 2012

Todos os direitos, incluindo os de reprodução total ou parcial, são reservados. Esta edição foi publicada com a autorização de Harlequin Enterprises II BV.

Todas as personagens deste livro são fictícias. Qualquer semelhança com alguma pessoa, viva ou morta, é pura coincidência.

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I.S.B.N.: 978-84-687-0259-9

Editor responsável: Luis Pugni

ePub: Publidisa

CAPÍTULO 1

O som constante das chamadas de telefone fez com que Anton Pallis se levantasse da sua secretária com um gemido de impaciência e se aproximasse da grande janela da qual tinha uma vista privilegiada de Londres. Assim que a notícia surpreendente da morte do filho de Theo Kanellis chegara aos jornais, o valor na Bolsa do seu império económico caíra a pique, e aqueles que lhe telefonavam naquele momento, queriam que ele seguisse o mesmo caminho.

– Embora compreenda, Spiro – disse ao interlocutor da única chamada que se incomodara em atender, – não tenciono juntar-me ao pânico geral.

– Nem sequer sabia que Theo tinha um filho – disse Spiro Lascaris, espantado por não ter sido informado de um detalhe tão importante e potencialmente perigoso. – Como todos, pensava que tu eras o seu único herdeiro.

– Nunca fui o seu herdeiro – disse Anton, irritado consigo próprio por não ter desmentido os rumores quando tinham começado a circular, há anos. – Nem sequer somos familiares.

– Mas viveste como se fosses seu filho durante os últimos vinte e três anos!

Anton abanou a cabeça, incomodado por ter de dar explicações sobre a sua relação com Theo.

– Theo limitou-se a cuidar de mim e a dar-me uma educação.

– Para além de te apoiar economicamente com o grupo de investimentos Pallis – indicou Spiro. – Não vais dizer-me que só o fez por bondade.

Reprimiu o impulso de acrescentar «visto que não tinha coração». Theo Kanellis ganhara a sua reputação por destruir impérios empresariais da concorrência, não por os apoiar.

– Admite-o, Anton – acrescentou: – Theo Kanellis formou-te desde os dez anos para que o substituísses.

Anton enfureceu-se.

– O teu trabalho é acabar com os rumores que questionam a minha relação com Theo, não alimentá-los.

Imediatamente, apercebeu-se de que ofendera Spiro, o seu colaborador mais próximo, mas era tarde para se arrepender.

– É óbvio – replicou ele. – Vou já tratar disso.

A conversa acabou com frieza. Anton desligou o telefone e, embora começasse a tocar imediatamente, ignorou-o. Todas as pessoas com algum interesse no mundo das finanças queriam saber o que significava a morte de Leander Kanellis, o filho repudiado por Theo e recém-descoberto pela imprensa, para a sua posição na Kanellis Intracom.

Isso era o que os preocupava e não a sua relação com Theo. Passara dois anos a gerir os seus assuntos, desde que o idoso se retirara para viver numa ilha privada devido à gravidade do seu estado de saúde, que tinham conseguido esconder.

E isso era a única coisa positiva a que podia agarrar-se, porque as ações da Kanellis não suportariam o golpe se todos descobrissem que Theo estava demasiado doente para se preocupar com os seus negócios. Por essa mesma razão, não se incomodara em negar os rumores de que Theo o preparava para gerir o seu império quando o sucedesse.

Praguejando, levantou o telefone e telefonou a Spiro para se assegurar de que não partilharia com ninguém a informação que acabara de lhe dar e ele, parecendo ofendido por ele achar necessário recordar-lhe um princípio tão básico, prometeu-lhe que nunca divulgaria informação confidencial.

Anton desligou, sentou-se na secretária e olhou para o chão. Sentia-se como um malabarista: uma das bolas que tinha de manter no ar era os interesses empresariais de Theo e os dele. A outra, a sua própria integridade e honra. E surgia uma terceira, muito mais imprevisível, que representava Leander Kanellis, um homem que Anton só recordava vagamente, que fugira com dezoito anos de um casamento por conveniência e de quem não tinham voltado a saber nada.

Até àquele momento, quando tinham recebido a notícia de que falecera. Mas nem sequer era isso que estava a causar o caos generalizado, mas a descoberta de que Leander deixara uma família e herdeiros legítimos da Kanellis.

Estendendo o braço, Anton pegou no jornal sensacionalista que dera o exclusivo e observou a fotografia que o jornalista publicara com o artigo. Nela aparecia Leander Kanellis com a sua família num passeio. Ao fundo, via-se um lago e árvores e o sol brilhava. Sobre um desportivo antigo havia uma cesta de piquenique e à frente do carro aparecia Leander, moreno, alto e muito atraente, extremamente parecido com Theo há várias décadas.

Leander sorria para a máquina com uma expressão de felicidade e orgulhoso das duas mulheres loiras que tinha ao seu lado. A mais velha, a sua esposa, era uma mulher bonita, com uma expressão serena que contribuía para explicar a relação duradoura do casal, apesar das dificuldades que tinham enfrentado em comparação com o que teriam vivido se Theo não tivesse…

Anton interrompeu essa linha de pensamento devido à culpa que despertava nele. Desde os oito anos tinha recebido o melhor que a riqueza de Theo podia proporcionar, enquanto aquelas pessoas tinham tido de lutar para…

Voltou a bloquear a sua mente porque ainda não estava com disposição para analisar como a nova situação o afetaria.

Preferia pensar na felicidade de Leander, porque pelo menos isso era uma coisa de que pudera desfrutar e que ele só sentira esporadicamente. Uma felicidade que as três pessoas que apareciam na fotografia irradiavam.

Anton concentrou-se na outra mulher. Embora a fotografia devesse ser antiga, visto que não parecia ter mais de dezasseis anos, Zoe Kanellis já estava prestes a transformar-se numa mulher tão bela como a sua mãe. Tinha a mesma figura esbelta, o seu cabelo dourado, os seus olhos azuis e um sorriso amplo e sensual.

«Felicidade.» A palavra atingiu-o no peito. Outra fotografia acompanhava o artigo, em que se via a versão de vinte e dois anos de Zoe, a sair do hospital com o último membro da família ao colo. A dor e a consternação tinham apagado a felicidade do seu rosto. Estava pálida e magra, e parecia cansada.

Zoe Kanellis, a deixar o hospital com o seu irmão recém-nascido, dizia a legenda da fotografia. A jovem de vinte e dois anos estava na universidade de Manchester quando os seus pais se tinham visto envolvidos num acidente fatal de viação na semana passada. Leander Kanellis morrera imediatamente. A sua esposa, Laura, vivera o suficiente para dar à luz o seu filho. A tragédia acontecera em…

Alguém bateu à porta do escritório e fez com que Anton levantasse a cabeça ao mesmo tempo que entrava a sua secretária, Ruby.

– O que se passa? – perguntou ele, com aspereza.

– Lamento incomodar-te, Anton, mas Theo está na linha principal e quer falar contigo.

Anton praguejou e, por uma fração de segundo, pensou em não atender. Mas isso era impossível.

– Está bem. Passa-me a chamada.

Anton deu a volta à secretária e sentou-se ao mesmo tempo que levantava o telefone e esperava que Ruby lhe passasse a chamada. Infelizmente, a chamada confirmou o seu principal temor.

Kalispera, Theo – cumprimentou, amavelmente.

– Quero esse menino, Anton – ouviu a voz dura e irascível de Theo Kanellis. – Traz-me o meu neto!

– Não sabia que eras uma Kanellis – disse Susie, olhando com expressão espantada para o famoso logótipo da Kanellis Intracom que encabeçava a carta que Zoe acabara de deixar cair desdenhosamente sobre a mesa da cozinha.

– O meu pai tirou o «Kan» ao apelido quando se instalou aqui – «porque temia que o valentão do seu pai o localizasse e o obrigasse a voltar para a Grécia», pensou Zoe. Mas a Susie deu outra explicação: – Pensou que Ellis seria mais fácil de pronunciar em Inglaterra.

Susie mantinha os olhos esbugalhados.

– Mas sempre soubeste que eras uma Kanellis? Zoe assentiu.

– Está na minha certidão de nascimento – «e na de Toby», acrescentou para si. – Odeio-o – disse, contendo as lágrimas ao recordar os dois certificados de falecimento em que se via o mesmo nome.

– Esquece-o – Susie apertou-lhe a mão afetuosamente. – Não devia tê-lo mencionado.

E porque não, se estava em todos os jornais graças a um jovem jornalista que reparara no apelido quando cobria a notícia do acidente e se incomodara em investigar? Zoe pensou com amargura que o exclusivo lhe daria uma promoção ou um trabalho melhor num dos grandes jornais.

– É estranho – disse Susie, recostando-se na cadeira enquanto percorria com o olhar a cozinha que servia de salão.

– O quê? – perguntou Zoe, pestanejou para conter as lágrimas.

– Que sejas a neta de um empresário grego multimilionário, mas vivas num apartamento modesto ao lado do meu no centro de Islington.

– Não penses que isto vai ser um conto de fadas na vida real – levantando-se da mesa, Zoe levou as duas chávenas de café para o lava-loiça. – Nem sou nem quero ser a Cinderela. Theo Kanellis – Zoe nunca pensara nele como o seu avô, – não significa nada para mim.

– Mas nesta carta diz que Theo Kanellis quer conhecer-te – indicou Susie.

– A mim não, a Toby.

Zoe virou-se e cruzou os braços. Perdera peso durante as últimas semanas e o seu cabelo, normalmente brilhante e lustroso, pendurava mortiço de um rabo-de-cavalo que enfatizava a tensão das suas feições. Umas sombras profundas rodeavam os seus olhos azuis e os seus lábios, que tinham sempre um sorriso fácil, tinham adotado uma curva descendente que só se alterava quando pegava em Toby ao colo.

– Esse homem repudiou o seu próprio filho! Nunca quis conhecer a minha mãe nem a mim. A única razão por que agora se mostra interessado é porque está envergonhado por a imprensa estar a falar disso. E suponho que é porque tenciona moldar Toby para o transformar num clone de si próprio, já que com o meu pai não o conseguiu – Zoe respirou fundo. – É um homem frio, cruel e déspota e não tenciono deixar Toby nas suas mãos!

– Ena! – exclamou Susie. – Vê-se que guardas ressentimento.

«Nem imaginas», pensou Zoe, com amargura. Com um apoio mínimo por parte do seu pai, o filho de Theo não teria tido de passar vinte e três anos a mimar e a reparar o antigo desportivo com o qual fugira para Inglaterra. Só durante as noites recentes, quando acordava a visualizar o acidente, é que se apercebera de que o seu pai se agarrava àquele carro estúpido porque era a única lembrança que lhe restava do seu lar familiar. Se o seu avô fosse um homem menos cruel, possivelmente, só possivelmente, o seu pai teria levado a sua mãe ao hospital num carro mais novo e seguro, que os teria protegido do impacto que lhes teria salvado a vida. Ela continuaria a estudar a sua pós-graduação em Manchester e Toby estaria a dormir no quarto que os seus pais tinham preparado para ele com tanto amor.

– Aqui diz que às onze e meia chegará o seu representante – disse Susie, referindo-se ao conteúdo da carta. – Deve estar quase a chegar.

Seria apenas mais uma das dezenas de pessoas que tinham entrado e saído da vida de Zoe nas últimas semanas: médicos, parteiras, assistentes sociais de centenas de departamentos diferentes que queriam assegurar-se de que estava em condições de cuidar do seu irmão, cada um deles com um questionário interminável sobre a sua vida privada. Claro que deixaria a universidade para cuidar de Toby. É óbvio que estava disposta a trabalhar se o salário incluísse facilidades para cuidar do menino. Não, não tinha namorado. Não era promíscua nem irresponsável. Claro que não deixaria Toby sozinho em casa enquanto ela ia a festas. As perguntas sucediam-se várias vezes, uma atrás da outra, cada uma mais estúpida do que a anterior.

E também as pessoas da funerária, que com amabilidade e delicadeza a tinham ajudado a tomar decisões que para uma filha perdia na dor eram terrivelmente complicadas. O enterro tivera lugar há três dias e o seu avô não se incomodara em enviar a nenhum «representante» para ver como enterravam o seu único filho e a sua nora. Qualquer que fosse o motivo, Zoe só sabia que ele tinha preferido permanecer na sua torre de marfim enquanto os jornalistas apareciam no funeral como predadores.

E isso levou-a ao final da lista de pessoas com quem fora obrigada a lidar durante as últimas semanas: as baratas que tinham aparecido por todo o lado assim que tinham descoberto a história. As que tinham batido à sua porta a oferecer-lhe dinheiro para lhes vender o exclusivo, as que tinham acampado fora da sua casa para a perseguir cada vez que saía… Jornalistas que não estavam ali porque se importavam com a sua perda trágica, mas porque Theo Kanellis era um magnata que protegia a sua vida privada e aquela história era tão suculenta como um pêssego amadurecido que desejavam morder mesmo que o sumo fosse amargo e no centro houvesse um verme repugnante.

De facto, até o verme tinha um nome atraente para a imprensa: Anton Pallis, o playboy, alto e moreno que geria o grupo Pallis e que não parecia importar-se com aparecer nos jornais, quer fosse por trabalho ou por prazer. Zoe lera sobre ele frequentemente e deduzira que fora o homem que beneficiara com o exílio do seu pai.

Só de pensar no seu nome sentia que lhe fervia o sangue e mais de uma vez se perguntara se o impulso destruidor que a possuía e que a levava a alimentar o ódio que sentia por ele seria a manifestação da parte grega de si própria que até então nunca reconhecera.

A campainha da porta tocou e as duas mulheres ficaram alerta.

– Talvez seja um jornalista a tentar a sorte – disse Susie.

Mas Zoe intuiu que se tratava do representante de Theo. Eram onze e meia em ponto e os homens ricos esperavam que as suas ordens se cumprissem à letra. Endireitou os ombros, convencida de que finalmente descobriria o que Theo pretendia.

– Queres que fique?

Zoe olhou para a sua vizinha, que estava em avançado estado de gestação e pensou que não podia pedir-lhe mais do que já pedira naquelas últimas semanas.

– É quase hora de que ires buscar Lucy – recordou, consciente de que tinha de enfrentar aquilo sozinha.

– Tens a certeza? – quando Zoe assentiu, Susie disse: – Está bem. Sairei pela porta de trás.

A campainha voltou a tocar e as mulheres mexeram-se em direções opostas. Zoe ouviu a porta traseira a fechar-se no momento em que chegava à frente da porta principal. Tinha a garganta seca e o coração acelerado. Limpou as mãos húmidas de suor nas calças de ganga e, depois de fazer uma expressão fria e impessoal, abriu.

Esperava encontrar-se com um homem grego, baixo e robusto, com aspeto de advogado, portanto quando viu de quem se tratava, ficou paralisada de surpresa.

Alto e moreno, parecia um príncipe exótico vestido com um fato italiano. As suas feições angulosas e os seus olhos pretos apanharam o seu olhar como um imã. Zoe não recordava ter visto uns olhos como aqueles, com o poder de a fazer tremer. Nem sequer foi capaz de desviar o olhar quando nas suas costas ouviu a gritaria dos jornalistas. Era tão alto que não conseguia vê-los. Ele nem se alterou, protegido como estava por três homens com óculos escuros que formavam um semicírculo atrás dele.

Quando finalmente Zoe conseguiu desviar o olhar dos seus olhos, deslizou-o para uma boca sensual que não sorria. Um amontoar de emoções assaltou-a num redemoinho que não foi capaz de identificar. Estava hipnotizada pelo poder que emanava dele, pelos seus ombros largos e relaxados, pela elegância da sua pose e pela segurança em si próprio que exsudava.

Pela primeira vez em três semanas, foi consciente do aspeto desalinhado que apresentava, de que tinha umas calças de ganga gastas e uma velha blusa de lã vermelha, que vestira porque tinha pertencido à sua mãe e o seu cheiro a fazia pensar nela, e que tinha o cabelo sujo.

O homem disse:

– Bom dia, menina Kanellis! Se não me engano, estava à minha espera.

A sua voz aveludada e um leve sotaque grego recordaram-lhe tanto o seu pai que Zoe sentiu que se enjoava.

Anton viu-a fechar os olhos e ao ver que balançava, temeu que desmaiasse. Apresentava um aspeto ainda mais frágil do que o da fotografia, como se um sopro de vento pudesse atirá-la ao chão.

Resmungando alguma coisa, reagiu instintivamente e estendeu a mão para a segurar, mas naquele momento, ela abriu os olhos e deu um passo atrás como se repelisse uma serpente.

A ofensa paralisou Anton, que teve de fazer um esforço sobre-humano para que o seu rosto não o delatasse. Consciente de que tinham a imprensa atrás, pensou com rapidez. Tinham de entrar na casa e fechar a porta.

– Importa-se se…? – disse, em tom amável, dando um passo para dentro.

Mais uma vez, quando pôs a mão no trinco para fechar a porta, Zoe retirou a sua precipitadamente para evitar que lhe tocasse. Anton voltou a sentir-se ofendido, mas obrigou-se a escondê-lo.

Assim que ficaram a sós, fez-se um profundo silêncio. Zoe afastou-se dele e Anton não conseguiu evitar pensar que parecia um pássaro preso.

Tinha uns olhos azuis incríveis e uns lábios vermelhos como morangos. A parte inferior do seu corpo despertou ao olhar para ela e Anton repreendeu-se por se sentir excitado num momento tão inoportuno.

– Peço-lhe desculpas por ter entrado em sua casa sem ser convidado – disse, num tom grave, – mas não penso que queira testemunhas da nossa conversa.

Ela ficou em silêncio e limitou-se a olhar para ele com os seus olhos de pestanas espessas, embora Anton tivesse a estranha sensação de que nem sequer o via.

– Permita-me que me apresente. O meu nome é…

– Sei quem é – disse Zoe, num tom trémulo.

Era o homem cujo nome aparecera na imprensa quase tantas vezes como o dela, o homem com que Theo Kanellis tinha substituído o seu pai.

– É Anton Pallis.

O filho adotivo e herdeiro de Theo Kanellis.

CAPÍTULO 2

Houve um silêncio carregado de censura por parte de Zoe, que mal conseguia esconder o desprezo que sentia por Anton.

Ele esboçou um sorriso.

– Portanto, ouviu falar de mim.

Zoe esboçou um sorriso carregado de desdém.

– Teria de ser surda e cega para o ter evitado, senhor Pallis – disse, ao mesmo tempo que dava meia volta e ia para a parte traseira da casa.

Anton aproveitou para olhar à sua volta. A casa era pequena, uma construção vitoriana típica em cujo vestíbulo havia uma escada estreita e levantada e duas portas de pinho que davam acesso a outras divisões. Estava agradavelmente decorada e o chão estava coberto por uma carpete bege, mas Anton nunca teria imaginado que o filho de um multimilionário teria acabado a viver assim.

Sem falar, Zoe saiu pela porta do fundo e, respirando profundamente, Anton decidiu segui-la. Encontrou-a numa cozinha surpreendentemente ampla que servia de salão, com um canto de estar onde havia um sofá e uma poltrona azuis. Uma televisão ocupava um canto e, sobre a mesa de café, estavam desdobrados vários jornais. A outra metade da divisão era ocupada por uma grande mesa de madeira rodeada de móveis de cozinha de pinho. Nas prateleiras viam-se as coisas próprias de um bebé, e junto do sofá, um berço vazio.

– Está a dormir lá em cima – disse Zoe, ao seguir a direção do seu olhar. – O barulho que os jornalistas fazem incomoda-o – explicou, – portanto instalei-o no quarto que dá para o jardim, que é o mais silencioso.

– Não chamou a polícia para os impedir de a incomodar?

Zoe olhou para ele, perplexa.

– Não somos a família real, senhor Pallis. E os jornalistas não atendem à razão. Agora, se me desculpar…

Sentindo-se como se tivesse sido repreendido pela sua professora, Anton viu-a sair pela porta traseira. Por uma fração de segundo, pensou que ia fugir, mas pela janela viu que percorria o jardim até uma porta de madeira e a fechava. Nesse momento, apercebeu-se de que Zoe devia viver como uma prisioneira na sua própria casa e, ao mesmo tempo, não pôde evitar perguntar-se se a última pessoa que saíra por ali, mesmo antes de ele chegar, teria sido um amante.

Por alguma estranha razão, imaginar Zoe nos braços de um homem perturbou-o. Os planos que tinha para Zoe Kanellis não incluíam o incómodo de ter de se livrar de um amante.