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HarperCollins 200 anos. Desde 1817.

 

Editado por Harlequin Ibérica.

Uma divisão de HarperCollins Ibérica, S.A.

Núñez de Balboa, 56

28001 Madrid

 

© 2014 Melanie Milburne

© 2017 Harlequin Ibérica, uma divisão de HarperCollins Ibérica, S.A.

Um casamento inesquecível, n.º 1707 - 1.3.17

Título original: The Valquez Bride

Publicado originalmente por Mills & Boon®, Ltd., Londres.

 

Reservados todos os direitos de acordo com a legislação em vigor, incluindo os de reprodução, total ou parcial.

Esta edição foi publicada com a autorização de Harlequin Books S.A.

Esta é uma obra de ficção. Nomes, carateres, lugares e situações são produto da imaginação do autor ou são utilizados ficticiamente, e qualquer semelhança com pessoas, vivas ou mortas, estabelecimentos de negócios (comerciais), feitos ou situações são pura coincidência.

® Harlequin, Sabrina e logótipo Harlequin são marcas registadas propriedades de Harlequin Enterprises Limited.

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Imagem de portada utilizada com a permissão de Harlequin Enterprises Limited.

Todos os direitos estão reservados.

 

I.S.B.N.: 978-84-687-9394-8

Sumário

 

Página de título

Créditos

Sumário

Capítulo 1

Capítulo 2

Capítulo 3

Capítulo 4

Capítulo 5

Capítulo 6

Capítulo 7

Capítulo 8

Capítulo 9

Capítulo 10

Capítulo 11

Capítulo 12

Se gostou deste livro…

Capítulo 1

 

A palavra que se destacava no testamento do pai de Teddy começava com a letra C, mas não estava em maiúscula. Surpreendida, olhou boquiaberta para o advogado da família.

– Casamento?

Benson assentiu, enfaticamente.

– Receio que sim. Dentro de um mês. Caso contrário, Hugo, o seu primo em segundo grau, vai herdar toda a fortuna. As propriedades, ações e outros bens, incluindo a mansão Marlstone.

– Não pode ser! – Teddy segurou os braços da cadeira com tanta força, que os dedos se cravaram no couro do estofo como se fossem garras. – O papá disse que esse lugar seria meu, um dia, antes de morrer. Garantiu-me que sempre teria esse lugar.

– O seu pai alterou o testamento, um mês antes de lhe ter sido diagnosticado cancro – afirmou o advogado. – Era como se soubesse do pouco tempo que tinha pela frente e resolvesse encaminhar os negócios.

Os negócios?

Era a sua casa! O negócio era dela, era a vida dela! A sua segurança estava em jogo. Como é que o pai pudera entregá-la ao primo, que nem sequer aparecera enquanto ele estivera doente?

O coração de Teddy estava a bater com tanta intensidade, que sentia o sangue a circular na ponta dos dedos. Foi tomada por um choque que lhe congelou o corpo, como uma vaga de gelo. Pestanejou para aclarar a visão. Que pesadelo era aquele? Estava mesmo sentada na biblioteca, a ter uma conversa maluca com o advogado do pai?

Deve haver um engano.

Nos últimos cinco anos, cuidara do pai enquanto ele tivera cancro no pâncreas; estivera junto dele até ao momento da despedida, segurando-lhe a mão. Tinha sido o único momento em que se sentira próxima dele. Durante esses últimos dias, o pai tinha partilhado fragmentos da sua infância, que ela desconhecia até então. Diziam muito sobre a sua personalidade complicada. Sobre a sua incapacidade de lidar com ela e a impossibilidade de lhe agradar. Sobre como era controlador, como nunca a deixava fazer parte de nada. E pôde, por fim, encontrar um lugar no seu coração, para o perdoar. Pôde até dizer que o amava, algo que duvidara que pudesse vir a fazer.

Mas, na verdade, fora enganada durante todo esse tempo?

Fora traída?

Engoliu em seco, perturbada pelo nó de mágoa entalado na garganta, como uma avelã avantajada. Como pudera cair nessa, deixar que pai fizesse isso com ela? Fizera com que se sentisse segura e puxara o tapete do seu conforto. Como não tinha percebido? Como conseguira ser tão… Tão burra, a ponto de cair nessas histórias de família?

– O meu pai fez-me acreditar que Marlstone seria sempre minha – Teddy tentou falar de maneira clara e direta, apesar de as suas emoções se debaterem e a revoltarem dentro do peito, como roupa numa secadora, a uma velocidade acima do normal. – Porque teria mudado de ideias? Claro que não preciso estar casada, para herdar o que é meu por direito! É algo inaceitável!

O advogado bateu com a caneta que segurava no documento.

– É um pouco mais complexo do que isso… – Fez uma pausa, como se procurasse uma maneira de continuar a falar, sem a perturbar ainda mais. – O seu pai também nomeou um noivo.

Era como se uma mão na barriga lhe revirasse os intestinos.

– O quê?

Entregou-lhe o documento.

– Ele quer que se case com Alejandro Valquez.

Teddy olhou para o nome. Começou a imaginar o sujeito. Sentiu a base da coluna vertebral a tremer, enquanto imaginava um playboy alto, moreno, de olhos escuros, com o sorriso enigmático de um anjo caído. O homem pelo qual todas as mulheres se atropelam para tirar um «pedacinho». Era como se duas chamas estivessem acesas nas suas bochechas. Só podia ser brincadeira. O pai não podia ser tão cruel. Obrigá-la a casar com alguém tão acima do seu patamar, algo que despertaria gargalhadas no momento do anúncio. A imprensa troçaria dela, seria impiedosamente ridicularizada. Ninguém acreditaria. Alejandro Valquez e ela? Já imaginava os títulos de destaque: Jovem sem graça da mansão e playboy argentino herdam terras com um casamento de fachada.

O que tinha feito para merecer isso? Era uma maneira de o pai demonstrar todo o desgosto pelas suas limitações? Tornando-a alvo de troça e desprezo? Sendo motivo de piadinhas infames durante os próximos dez anos?

Teddy respirou fundo, voltando a encarar o advogado, lentamente. Precisava de se acalmar. Tinha de haver uma maneira de resolver a questão. Entrar em pânico não ajudaria em nada. Não era do seu feitio. Resolvia as coisas com calma, com jeito, embora na verdade os seus nervos estivessem à flor da pele.

– Não há forma de… Dar um jeito nisso?

– Não, se pretende ter direito à ocupação e posse integral da mansão Marlstone.

Olhou para os jardins, pelas janelas da biblioteca, para os campos que se estendiam para além deles. Vales verdejantes que acabavam em espessas cercas vivas, a curva do rio que cruzava a floresta até às margens da fronteira superior. A superfície silenciosa do lago, o sicómoro, as faias e os teixos, imóveis durante séculos, enquanto a vida decorria à sua volta.

O casarão de Wiltshire e os arredores eram o seu lar. Serviam de inspiração para o seu trabalho, como ilustradora de livros infantis. As suas ilustrações de botânica, com temas fantásticos, eram inspiradas em tudo aquilo.

Era ali que tinha o seu estúdio.

A sua casa.

O seu santuário.

Como poderia perder tudo isso? Como poderia ser despejada, como se fosse uma arrendatária qualquer? Em que estaria a pensar o pai?

Sentiu o estômago a revirar-se, outra vez.

O pai nunca chegara a importar-se verdadeiramente com ela?

Não sabia o quanto detestava homens como Alejandro Valquez? Alejandro era um playboy rico e bonito que, tal como o irmão Luiz, só saía com supermodelos e estrelas de cinema. Mulheres lindas. Perfeitas.

Alejandro nem reparara nela, no passado. Mulheres como ela eram invisíveis para homens assim. O seu olhar, negro como o carvão, tinha passado por ela quando tinham sido apresentados num evento de polo, a que fora com o pai há alguns anos.

Alejandro mal a tinha cumprimentado, quando avistara uma loira magra e alta, atrás dela, de quem ficara noivo pouco tempo depois. Esse caso turbulento ficara em evidência durante semanas, meses, até a noiva, Mercedes Delgado, desistir do casamento no último minuto.

Onde queria chegar o pai, obrigando-a a casar com um homem que poderia escolher a mulher que quisesse? O que levaria o pai a desejar essa aliança, mesmo que provisória?

Teddy e o pai nunca tinham sido próximos. Ele nunca disfarçara o facto de que preferia ter tido um filho. Desde a infância que a recriminava por tudo o que dizia e fazia. Mas, como toda a menina do papá, nunca deixara de o amar. Queria obter o seu reconhecimento. Queria conquistá-lo. Levara anos a perceber que ele era muito obcecado pelo trabalho, por vencer cada batalha corporativa, para se importar com ela. Não tinha tempo, embora tivesse feito de tudo para garantir a sua custódia, depois de se divorciar da mãe. Ganhar a custódia era só mais uma batalha. Mais uma vitória.

Seria uma vingança, por nunca o ter perdoado pela morte precoce da mãe? Ou tinha tanta vergonha da sua única filha, com uma vida pacata, de solteirona, que decidira fazer algo a respeito, empurrando-a para um homem que jamais conquistaria por outros meios?

O apelido Valquez era sinónimo de riqueza e prestígio. Uns playboys que jogavam polo com a mesma intensidade com que faziam uma festa. Se aqueles irmãos com uma vida agitada resolvessem casar, não seria com alguém como ela.

Teddy voltou a encarar o advogado.

– O que ganha Alejandro com isso? Porque concordaria com algo assim?

– O seu pai comprou algumas terras ao pai de Alejandro, na Argentina, há vinte anos, para aliviar o aperto financeiro da família, depois de Paco Valquez ter sofrido um acidente a jogar polo, ficando tetraplégico – respondeu Benson. – O seu pai era o proprietário durante todo este tempo, apesar das inúmeras ofertas de Alejandro, para as readquirir. Ele terá a escritura das propriedades, após o casamento.

Seria trocada por um pedaço de terra? Entregue como um troféu? Como um imóvel? Como é que o pai fora capaz de fazer isso com ela? «Foi-se o tempo da tirania. Estamos no século XXI. As mulheres já podem escolher o marido».

Apaixonar-se.

Ser correspondida.

Teddy sonhara em segredo com uma vida de conto de fadas, até aos sete anos, quando os pais se tinham divorciado. Acreditava no poder do amor, ainda que não o tivesse sentido, pessoalmente. As pessoas tinham de se apaixonar e permanecer assim. Nada de casamento por prestígio, bens ou interesses financeiros.

Como poderia ignorar os desejos mais profundos do seu coração, casar por outro motivo para além do amor? Iria contra todos os seus princípios. Recusava-se a ser como a mãe, casando-se pelo status, pela segurança que ele lhe podia proporcionar, para depois passar vergonha, com todos a rir na sua cara, quando as máscaras caíssem.

Tinha de haver uma saída.

Teddy olhou para o advogado, outra vez.

– O que pensa Alejandro, a esse respeito? Já foi informado?

– Digamos que está de mãos atadas – replicou o advogado.

– Como assim?

– O seu pai preparou as coisas de tal forma que, se ele recusar o casamento, a propriedade que tanto deseja será vendida.

– Mas, certamente, um homem com tantas riquezas poderia comprá-la, quando estivesse à venda.

O advogado abanou a cabeça.

– Receio que isso não seja possível. O seu pai foi bem enfático. A propriedade será vendida a um investidor, se Alejandro desrespeitar os termos do testamento. Um investidor local já demonstrou interesse e vai arrematar a propriedade num estalar de dedos, assim que ela estiver disponível. Imagino que Alejandro não desistiria daquelas terras com tanta facilidade, mesmo que tivesse de se casar com uma perfeita estranha. Vendo por esse lado, todos saem a ganhar.

Teddy espumou de raiva. Então, o advogado do pai, assim como todo mundo, considerava-a incapaz de arranjar um marido, de outra maneira? Endireitou-se e lançou ao advogado o seu famoso olhar gélido.

– Pois diga ao señor Valquez que sob hipótese alguma cogitaria casar com ele.

– Está a brincar? – Alejandro observou o representante legal da Marlstone Incorporated, no seu escritório de Londres.

– Se quiser a propriedade de Mendoza, que Clark Marlstone comprou ao seu pai, é isso que terá de fazer.

– Ele não a comprou ao meu pai – rebateu, com os dentes cerrados. – Roubou. Pagou muito menos do que valia. Aproveitou-se da situação do meu pai, após o acidente. Manipulou as coisas para poder colocar as mãos naquelas terras, como se estivesse a fazer um favor.

Canalha.

– Seja como for, tem a possibilidade de recuperar tudo, sem ter de desembolsar um cêntimo.

Alejandro respirou fundo. Teria de pagar, sim. Com a sua liberdade. Aquilo que mais prezava.

– Nem me lembro da filha do Marlstone. Theodora, é isso? Quem é ela? O que pensa a respeito disso? Ou é ela que está por detrás de tudo isto?

Conseguia imaginá-la. Uma menina mimada. Mais uma interesseira, atrás do casamento. Uma menina do papá a querer subir na vida, a levar uma vida fácil. Decerto convencera o pai doente a preparar as coisas para ela ficar com a casa. Um marido como troféu, sem ter de se esforçar.

Com ele, não.

– Está tão indignada quanto você – disse o advogado. – Ela pretende contestar o testamento.

«Até parece». Alejandro conhecia bem a dissimulação das mulheres. Theodora Marlstone reclamaria, faria um escândalo para disfarçar as suas verdadeiras motivações. Claro que queria casar com ele. Era considerado um ótimo partido. O solteiro mais cobiçado da Argentina, talvez do mundo.

– Quais são as hipóteses dela?

– Poucas – respondeu o advogado. – O testamento não deixa dúvidas. Clark Marlstone escreveu-o enquanto ainda estava lúcido. Havia três médicos como testemunhas, certamente por suspeitar que um de vocês se negaria a cumprir o estabelecido e tentaria encontrar uma lacuna. Reverter a situação seria caro e trabalhoso. O meu conselho é aceitar e aproveitar da melhor maneira. São só seis meses.

«Para si, é fácil falar.»

Alejandro levou as mãos à cabeça. Já tinha muitas responsabilidades, ao cuidar das crianças da rua, Sofi e Jorge. Oferecia comida, casa, educação e carinho, na medida do possível, para um solteiro. Aquilo de que menos precisava era de uma esposa. Jorge tinha quinze anos e ainda estava naquela fase de indecisão, entre respeitar os adultos e revoltar-se, assim como o seu irmão Luiz, na mesma idade, e precisava de ser protegido dos perigos. Sofi, com dezoito, era mais madura e recentemente tinha manifestado o desejo de se mudar para Buenos Aires, para tirar um curso de estética e cosmética. Não gostava muito da ideia de ela se mudar para uma cidade grande, longe do apoio dele e dos seus funcionários.

Casar seria uma decisão difícil, mesmo que fosse com alguém de quem realmente gostasse. Mas, casar com uma estranha? Sentia-se incomodado com a ideia de casar, de se prender a alguém. Conferir a alguém o poder de estar lá num instante e depois desaparecer, como a mãe fizera com o pai. Ostentar uma aliança e criar filhos, para depois fugir porta fora, rumo a uma nova vida em França, deixando para trás a aliança, os papéis do divórcio e dois meninos desnorteados.

Alejandro já tinha tentado relacionar-se uma vez, mas fracassara. Imensamente. O pior de tudo é que tinha percebido. O que mais o incomodava era deixar-se levar pelo que sentia e não pelo que pensava. Sabia que as mulheres só se interessavam por uma coisa e era tolice acreditar que seria diferente. Elas só queriam saber de dinheiro e segurança. Faziam de tudo por isso. Apaixonavam-se e desapareciam conforme o tamanho da carteira. Não importava se fazia parte da sua natureza ou do ADN. Não seria trapaceado, não se apaixonaria de novo.

Agora, estava mais velho, mais experiente. Não deixava que as emoções interferissem nos negócios. Não permitiria que os sentimentos obscurecessem a razão, que influenciassem na hora das decisões, dos deveres. Não tinha reconstruído o império do pai com sentimentos. Fora preciso superar os adversários com suor e sangue. Independentemente do obstáculo, dava a volta ou passava por cima. Eliminava.

Agora, não seria diferente.

– Onde está ela? – perguntou Alejandro, ao mordomo impecavelmente vestido que atendeu a porta na mansão de Marlstone, em Wiltshire.

As sobrancelhas fartas, brancas e peludas como duas lagartas, conferiam uma aparência dura aos marejados olhos azuis.

– A menina Teddy tem um compromisso.

Que piada. Antes tivesse. Com outra pessoa.

– Tenho a certeza de que ela vai encontrar um espaço na sua agenda.

Teve de conter um grunhido sarcástico. A menina Teddy Marlstone, provavelmente, estava à espera que o bronzeador e o esmalte secassem, passando máscara nas pestanas postiças ou alguma parvoíce do género. Existia coisa mais fútil do que uma menina do papá?

E que nome era aquele, «Teddy»? O que pensava que era? Uma pessoa ou um brinquedo?

– Se puder esperar aqui, por gentileza, avisarei que deseja conversar com…

– Olhe, não é nada pessoal, amigo – interrompeu Alejandro. – Mas não tenho tempo ou vontade de ficar pendurado, à espera que a «madame» arranje as unhas. Vai levar-me até ela ou irei procurá-la. Como faremos?

– Nenhum dos dois – respondeu uma voz fria, atrás dele.

Alejandro virou-se e viu uma pequena figura, parada na ombreira da porta, na parede da sala coberta de azulejos brancos e pretos. Nada de unhas postiças ou bronzeamento artificial. A roupa parecia ter saído de uma loja beneficente e o cabelo dava a impressão de que dera um mergulho. Era um emaranhado de mechas, castanho-escuro, sobre a cabeça e os ombros, mais ondulado do que crespo. E o desleixo era evidente. Na melhor das hipóteses, tinha sido penteado com as mãos. Usava calças castanhas, que mais parecias sujas, uma camisa xadrez amarrotada e uma camisola desfiada. Era um traje masculino e desproporcional, como se tivessem atirado uma toalha sobre um palito para os dentes.

Porque se vestia de um jeito tão pavoroso? O que pretendia provar? A jovem era herdeira de uma propriedade que valia milhões. Poderia comprar as melhores roupas. Porque se vestia como uma mendiga?

Fixou o olhar na bengala com cabo de osso, na qual ela se apoiava, com ar desafiador.

Sentiu um aperto no peito, como quando se dá um passo em falso.

Então, era por isso.

– Senhorita Marlstone?

Señor Valquez, que prazer reencontrá-lo.

Alejandro não gostava de se sentir em desvantagem. De ela saber mais sobre ele, do que ele sobre ela. Manter os amigos por perto e os inimigos mais perto ainda, era o seu lema. Mesmo assim, havia algo nela que despertava o seu lado caridoso.

– Nós… Já nos conhecemos?

Ela apertou os lábios de uma maneira que poderia ser interpretada como um sorriso, mas não correspondia ao azul acinzentado, quase glacial, dos olhos.

– Sim. – Ergueu a cabeça, imediatamente. – Não se lembra?

Alejandro acionou rapidamente a sua memória. Saía com inúmeras mulheres e levava outras tantas para a cama. Mas não conseguiu lembrar-se de nenhuma cujos olhos fossem penetrantes, ao ponto de parecerem mais escuros do que realmente eram. Tinha sobrancelhas chamativas e pestanas igualmente marcantes, sem precisar de aplicar máscara. As bochechas eram acentuadas, combinando com o nariz. A boca era perfeita e tinha uma juventude inocente, apesar de um quê de cinismo que correspondia ao dele.

– Talvez deva refrescar a minha memória – retrucou, esboçando um sorriso. – Acabo por conhecer muita gente, no ramo em que trabalho.

Os olhos dela permaneciam inabaláveis, ao encararem os dele. Era como se conseguissem ver o garoto de dez anos que tivera de assumir responsabilidades após o acidente do pai e a fuga da mãe, para além da imagem de homem inabalável. Não usava maquilhagem, era um rosto sem cosméticos, sob os quais se esconder. Mesmo assim, a impressão de que estava calma, até demais, era algo inevitável.

– Conhecemo-nos no dia do polo britânico, há alguns anos.

– Verdade?

– No mesmo evento onde conheceu a sua ex-noiva.

Por detrás do sorriso formal, Alejandro cerrou os dentes. Fora direta ao ponto fraco. Vadia. Tal pai, tal filha. Brincara com ele. Rira na sua cara.

Refrescara a sua memória.

Odiava ser lembrado dos erros do passado. Aos vinte e quatro anos, acreditava ingenuamente na existência do amor. Naquele tempo, acreditara na possibilidade de uma vida plena e feliz, ao lado de alguém para amar, e ser correspondido. Que todo o dinheiro que possuía não era o mais importante. Tinha sido tomado pela ideia de constituir uma nova família, como aquela que a mãe tinha destruído quando abandonara o pai, devastado, seis meses depois do acidente.

Fora um erro.

– Desculpe, mas não me lembro desse encontro. – Observou-a de cima a baixo, enquanto tentava adivinhar a sua idade. Aparentava ter vinte e poucos anos mas, sem maquilhagem e vestindo-se como um rapaz maltrapilho, parecia bem mais jovem. – Chegámos a ser apresentados, formalmente?

– Sim.

resort

Quase qualquer coisa.

– Está preparada para abrir mão de tudo?

Acenou, indicando tudo à sua volta.

Ela encarou-o com a intensidade habitual.

– Está preparado para casar com uma estranha, por um pedaço de terra?

Observou-a demoradamente, atento aos pequenos e indolentes seios que a camisola quase não conseguia esconder.

– Vou pensar nisso.

Ela arregalou os olhos brilhantes, como se não acreditasse no que ouvia.

Tal como Teddy, Alejandro também se sentia incapaz de acreditar no que dissera. Dissera que ia pensar? Alerta vermelho. Perigo. Pânico.

Então, pensava em casar?

– Por que motivo essas terras são tão importantes para si? – perguntou.

Uma coisa que Alejandro tinha aprendido com os negócios era a disfarçar o interesse. Dava muito poder ao adversário. O melhor era ficar tranquilo e indiferente, como se fosse uma negociação qualquer. Nada de extraordinário. Tanto faz.

– O problema não é a propriedade. A questão é que não me sentiria bem se perdesse tudo, por causa de um casamento no papel durante seis meses.

A garganta dela fechou-se, novamente, como se engolisse algo.

– Disse… Papel?