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Editado por HARLEQUIN IBÉRICA, S.A.

Núñez de Balboa, 56

28001 Madrid

 

© 2002 Candace Camp

© 2014 Harlequin Ibérica, S.A.

Onde Tu Me Levares, n.º 14 - Maio 2014

Título original: Smooth-Talking Texan

Publicado originalmente por Silhouette® Books.

Publicado em português em 2005

 

Reservados todos os direitos de acordo com a legislação em vigor, incluindo os de reprodução, total ou parcial. Esta edição foi publicada com a autorização de Harlequin Books S.A.

Esta é uma obra de ficção. Nomes, carateres, lugares e situações são produto da imaginação do autor ou são utilizados ficticiamente, e qualquer semelhança com pessoas, vivas ou mortas, estabelecimentos de negócios (comerciais), feitos ou situações são pura coincidência.

® Harlequin e logótipo Harlequin são marcas registadas propriedades de Harlequin Enterprises Limited.

® e ™ são marcas registadas por Harlequin Enterprises Limited e suas filiais, utilizadas com licença. As marcas em que aparece ® estão registadas na Oficina Española de Patentes y Marcas e noutros países.

Imagem de portada utilizada com a permissão de Harlequin Enterprises Limited. Todos os direitos estão reservados.

 

I.S.B.N.: 978-84-687-5194-8

Editor responsable: Luis Pugni

 

Conversión ebook: MT Color & Diseño

Índice

 

Portadilla

Créditos

Índice

Um

Dois

Três

Quatro

Cinco

Seis

Sete

Oito

Nove

Dez

Onze

Doze

Volta

Um

 

Lisa Mendoza dirigia-se ao tribunal do condado de Angel Eye disposta a dar luta. Aquele era o tipo de caso que a tinha incentivado a entrar para a faculdade de Direito. Tratava-se de uma clara violação da justiça, um exemplo de preconceitos e de abuso de psoder. Lisa não sentia nenhum tipo de hesitação, como lhe tinha acontecido com frequência nos casos que lhe tinham atribuído até então, em que, normalmente, o seu cliente costumava ser culpado. Nestes casos, a única coisa a que Lisa podia aspirar era que se reduzisse o mais possível a condenação. Também não se tratava de um caso de violação dos direitos do consumidor, que tão frequentemente recebia desde que se mudara para a pequena cidade de Hammond, no Texas. O caso que a tinha levado a Angel Eye tinha a ver com um adolescente hispânico a quem tinham detido sem acusações na prisão de uma pequena cidade.

Semicerrou os olhos e pisou um pouco mais no acelerador ao pensar nisso. Há menos de uma hora, o primo de Benny Hernández tinha-se apresentado no seu escritório de Hammond e tinha-lhe explicado como Benny, que só tinha dezassete anos, tinha sido detido no dia anterior pelo xerife e conduzido à prisão, embora só tivesse cometido uma infracção de trânsito. O xerife não o tinha solto, nem sequer o tinha acusado de qualquer delito. Não tinham sido apresentadas queixas nem tinha havido testemunha alguma, por isso, a sua família estava, compreensivelmente, muito preocupada. E Enrique Garza, o homem que se apresentara no seu escritório, tinha decidido contratar um advogado para o rapaz.

— Algumas vezes, Benny pode ser um pouco selvagem — tinha admitido com um ligeiro sorriso, — mas não é um mau rapaz. Não quero que lhe façam mal.

Lisa podia imaginar o xerife a quem se preparava para ver: um homem de meia-idade com uma grande barriga que, sem dúvida, tinha considerado que Benny Hernández era culpado de algum delito simplesmente porque a sua pele era demasiado escura. Não era o condado de Bertram, do qual a pequena cidade de Angel Eye era a capital, um desses condados do Texas famosos por contar com xerifes corruptos e com um grande poder político? Estava quase certa de ter lido um artigo numa revista há alguns anos sobre esses xerifes que impunham a sua vontade pelos seus domínios. O condado de Bertram tinha sido um dos examinados. O xerife do qual falava a revista tinha morrido há poucos anos, se a memória não lhe falhava, porém, não seria nada estranho que a maquinaria política se pusesse em funcionamento com o propósito de nomear outro da mesma índole para o substituir.

Estava certa de que o xerife se mostraria renitente em falar com ela. Provavelmente, olhá-la-ia e decidiria que ela também não era importante: jovem, mulher e também hispânica. Não seria a primeira vez que alguém o fazia. No entanto, Lisa tinha aprendido que o facto de alguém a subestimar, com frequência, proporcionava-lhe vantagens e tinha-se assegurado de que os homens que a tinham tratado daquele modo se arrependessem de o ter feito.

Os seus lábios curvaram-se num sorriso ao pensar no confronto que a esperava. Tinha a intenção de que o xerife Sutton lamentasse o dia em que tinha tido a infelicidade de se cruzar com ela.

 

 

Quinn Sutton recostou-se sobre a sua cadeira, depois de cruzar as pernas em cima da secretária, e suspirou. Estava aborrecido e sentia-se frustrado. Como em algumas outras ocasiões desde que tinha regressado a Angel Eye, perguntou-se se não se teria enganado ao fazê-lo.

Uma simples investigação... que se tinha prolongado já por dois meses. Os homens com os quais tinha trabalhado em San Antonio teriam morrido de riso se tivessem descoberto como andava às cegas naquele caso.

Tinha pensado que Benny Hernández lhe proporcionaria alguma pista. O rapaz sabia alguma coisa, disso estava certo, mas, até àquele momento, tinha permanecido em silêncio. Além disso, não poderia mantê-lo na prisão durante muito tempo, dada a escassa importância do delito pelo qual o tinha detido.

As vozes que se ouviam no exterior do escritório tiraram-no do seu sono. Ficou à escuta e chegou à conclusão de que se tratava de vozes femininas, embora não pudesse distinguir o que estavam a dizer. Uma das vozes era a de Betty Murdock, a sua secretária, no entanto, não reconhecia a outra. Franziu o sobrolho e começou a levantar-se do seu lugar.

Naquele momento, o agente Hargrove assomou a cabeça pela porta com um ar de interesse e diversão no rosto.

— Xerife, saia por um momento. Tem que ver isto. É aquela nova advogada de que lhe falei.

— Quem? Qual advogada? — perguntou Quinn ao encaminhar-se para a porta. — Ah... Referes-te àquela.

— Sim. É bonita. Lembra-se de lhe contar que a tinha visto no tribunal do distrito de Hammond no mês passado?

— Sim, lembro-me — respondeu Quinn. Na verdade, a recordação era muito fraca. Hargrove estava sempre a falar em mulheres.

— Bom, pois está aí fora a arreliar Betty porque quer vê-lo.

— Nesse caso, o melhor será sair para lhe conceder o que deseja — replicou Quinn enquanto abria a porta para sair para o escritório exterior.

Viu que Betty estava de pé, com o rosto corado e as mãos nas ancas, num gesto combativo. Estava a enfrentar outra mulher. Quando Quinn se voltou para a olhar, todas as funções do seu corpo pareceram parar. Mais tarde, algo envergonhado, só pôde descrever a sensação como alguma coisa parecida com receber o tiro de uma pistola.

Não é que fosse a mulher mais bela que já tinha visto na sua vida. Não era refinada e esbelta como Jennifer, nem possuía a beleza gélida de princesa da alta sociedade da sua futura cunhada, Antonia, nem a formosura própria de uma estrela de Hollywood, como aquela actriz que Jackson tinha levado ao piquenique do Quatro de Julho. No entanto, tinha qualquer coisa que o deixou sem fôlego, como se lhe tivessem dado um soco no estômago.

Ia vestida com um fato de casaco castanho, muito próprio de alguém que se dedica à advocacia, uma blusa de cor creme e uns sapatos de salto baixo. A maquilhagem e o penteado eram pouco apelativos. No entanto, a simplicidade da sua roupa não podia ocultar a beleza das curvas que arredondavam o seu corpo nem a formosura das pernas que apareciam sob a saia. O seu cabelo, penteado com as pontas para dentro, era preto e muito brilhante. A sua pele, ligeiramente bronzeada, os seus enormes olhos castanhos e as suas espessas pestanas pretas tinham pouca necessidade de maquilhagem. Era uma mulher viva, quente e apaixonada... e parecia estar muito furiosa com alguma coisa.

— Insisto em ver o xerife Sutton! — exclamou, inclinando-se agressivamente sobre Betty. — Por muito importante que seja o que estiver a fazer, sugiro-lhe que entre no seu escritório e lhe diga que...

— Por que não me diz isso você mesma? — perguntou-lhe Quinn.

Atónitas, as duas mulheres voltaram-se para o olhar.

Durante um momento, Lisa ficou sem fala. Efectivamente, o xerife Sutton era um xerife típico, mas não do tipo que tinha imaginado. Em vez disso, era do tipo que a Associação Estatal de Xerifes teria escolhido como modelo para aparecer nos seus calendários. Teria pouco mais de trinta anos e era alto, mesmo sem os centímetros adicionais que lhe proporcionavam as botas de cowboy. O seu corpo forte e esbelto preenchia na perfeição a camisa e as calças do uniforme. Lisa teve consciência, com alguma surpresa e um pouco de vergonha, de que sentia uma estranha sensação no estômago. Tinha o tipo de corpo que podia fazer com que o coração de uma mulher batesse um pouco mais rapidamente.

Não era exactamente bonito, embora tivesse traços harmoniosos e uma boca bem definida que provocou outra resposta primitiva no corpo de Lisa. Uma cicatriz ao lado daquela boca e a firmeza do seu queixo davam-lhe um ar de determinação. Quando sorria, como estava a fazer naquele momento, os seus olhos mostravam um brilho atrevido e a boca adquiria um esgar que o fazia parecer mais como um rapaz. Ao ver que se dirigia a ela, olhando-a fixamente, Lisa chegou à conclusão de que era um sedutor. Tinha conhecido outros homens como ele, embora tivesse que admitir que não muitos e, mesmo que não fossem os mais espertos ou os mais bonitos ou os mais ricos, eram devastadores para as mulheres.

— Sou o xerife Quinn — disse, estendendo a mão e sem deixar de sorrir. — Prazer em conhecê-la.

Lisa encolheu os ombros. O xerife Sutton ia descobrir que ela era completamente imune aos seus encantos.

— Lisa Mendoza — replicou com voz cortante, ao mesmo tempo que apertava a sua mão com brevidade. — Sou a advogada de Benny Hernández.

— A sério? — perguntou ele, surpreendido. O sorriso desapareceu dos seus lábios. — Ora, isso é muito interessante. Não sabia que tinha advogado.

— Evidentemente. Senão, teria escolhido outra pessoa com quem implicar.

— Como?

— Acho que sabe perfeitamente do que estou a falar — replicou Lisa sem se deixar intimidar. — Você prendeu e reteve o meu cliente sem razão alguma. Suponho que, em geral, será bastante inteligente para procurar alguém sem um advogado que proteja os seus direitos quando gosta de assediar as minorias.

— Um momento, menina Mendoza...

— Agora gostaria de ver o meu cliente.

A ira reflectiu-se nos olhos do xerife. Lisa achou que ia responder-lhe torto, no entanto, ele limitou-se a comprimir o queixo.

— Venha comigo — disse.

Virou-se e pôs-se a andar pelo corredor sem se voltar para comprovar se Lisa o seguia. A jovem advogada pôs-se a correr atrás dele, decidida a não ficar para trás. Percorreram o corredor até ao final e chegaram a uma escada. Desceram e, depois de atravessar mais alguns corredores, chegaram a umas portas de metal, a cujo lado havia uma janela gradeada. O homem uniformizado que havia do outro lado levantou-se para os olhar.

— Olá, xerife — disse, um segundo antes de premir um botão.

Ouviu-se um forte ruído metálico e as portas abriram-se. Ambos passaram para o outro lado.

— Traz Benny para a sala de visitas — disse ao agente, que nessa altura os olhava através de uma janela idêntica que havia do outro lado.

— É claro, xerife — respondeu enquanto olhava para Lisa com curiosidade, certamente a perguntar-se quem seria.

Enquanto o agente fazia o que o xerife lhe tinha pedido, este acompanhou Lisa a uma pequena sala escassamente mobilada. Só continha uma mesa de metal, que estava atarraxada ao chão, e duas cadeiras, presas da mesma maneira. Lisa deixou a sua pasta em cima da mesa e voltou-se para olhar para a porta. Queria ver bem o seu cliente quando entrasse, para comprovar se tinha algum sinal de arranhões, cortes ou hematomas.

Para sua surpresa, quando a porta se abriu, entrou um rapaz vestido com um uniforme alaranjado que nem sequer levava algemas. Uma inspecção rápida mas escrupulosa revelou que não tinha marcas no rosto.

— Quem é você? — perguntou o rapaz, surpreendido.

— Sou a tua advogada, Benny — respondeu Lisa com um sorriso nos lábios enquanto estendia a mão. — O meu nome é Lisa Mendoza. Estou aqui para te ajudar.

O rapaz olhou-a desconcertado, no entanto, deu-lhe a mão. Então olhou para o xerife para procurar uma explicação. Este simplesmente encolheu os ombros. Em seguida, Benny encetou numa rapidíssima explicação em espanhol, que Lisa teve que deter com um gesto das mãos.

— Espera, desculpa. Receio que não fale espanhol — disse com as faces coradas pela vergonha.

O rapaz olhou-a, atónito. Nas suas costas, Lisa escutou que o xerife dava uma gargalhada, que conteve rapidamente. Lisa voltou-se para olhá-lo com um semblante furioso na cara.

— Necessito de um intérprete, xerife.

Sentiu que o seu rubor se tornava ainda mais vivo quando viu que a gargalhada continuava reflectida nos olhos do xerife. A sua falta de conhecimento da língua dos seus antepassados era algo que sempre a tinha envergonhado, mas era muito pior diante daquele homem. Lisa tinha a certeza de que se estava a deleitar com o desconforto que ela mostrava.

— Está bem — replicou ele, tentando não esboçar um sorriso. — Eu posso dar-lhe uma mão.

— Você? — perguntou-lhe Lisa, muito surpreendida. — Você fala espanhol?

— Sim. Fui polícia em San Antonio durante oito anos. É mais ou menos inevitável. É claro, se preferir um nativo, posso enviar-lhe o agente Padilla.

— Não acho que um oficial da polícia possa proporcionar a confidencialidade que...

— Não. Um momento, não importa — interrompeu Benny, com tom pacificador. — Eu falo inglês.

— Tens a certeza? — perguntou-lhe Lisa, voltando-se para o olhar. — Não quero que tenhas nenhuma dificuldade ou que possa haver mal-entendidos na hora de comunicar comigo.

— Claro que tenho a certeza. Eu cresci aqui — disse-lhe o rapaz, algo ofendido.

— Ah, bom. Sinto muito. Receio que não tive muito tempo de me familiarizar com a tua história. Quando o teu primo me explicou o teu problema, pensei que era melhor vir imediatamente.

— O meu primo? — perguntou Benny, muito surpreendido.

— Sim. Ele contratou-me em teu nome.

— Julio? — quis saber o rapaz, que estava completamente atónito. — Julio contratou-a?

— Não. Foi Enrique Garza quem me contratou.

— Ah! — disse Benny. Algo se tinha reflectido nos seus olhos. A surpresa que o tinha acompanhado até então abandonou-o — Entendo. Bem, sentemo-nos.

Lisa seguiu-o até à mesa e sentou-se à frente dele. Então abriu a sua pasta e tirou um bloco de notas e uma caneta.

— Muito bem, Benny. O senhor Garza falou-me muito brevemente das tuas circunstâncias, mas eu gostaria que mas contasses tu.

— Que lhe contasse o quê?

— O que aconteceu quando o xerife Sutton te deteve na outra noite.

Ao dizer aquilo, deteve-se. Então voltou-se para olhar significativamente para Sutton, que continuava na sala, a poucos metros deles, observando-os com os olhos semicerrados e os braços cruzados sobre o peito.

— Xerife Sutton, acho que já terá percebido que não posso ter uma conversa confidencial com o meu cliente se você estiver nesta sala.

— É claro, menina — replicou ele, com uma ligeira inclinação da cabeça. — Haverá um agente do outro lado da porta, caso precise — acrescentou, olhando para Benny.

— Não penso dar problemas, xerife — disse Benny, levantando as mãos de modo inocente.

Sutton assentiu e saiu da sala. Quando fechou a porta, deteve-se um momento do outro lado, com o sobrolho franzido.

— Está tudo bem, xerife? — perguntou-lhe Jerry finalmente.

— Não sei, Jerry. Já ouviste falar alguma vez de um tipo chamado Enrique Garza?

— Garza? Não, não me parece. Há muitos Garzas, mas não me recordo de nenhum que se chame Enrique. Há um tipo que trabalha numa loja da rua principal que se chama Enrique, no entanto, estou completamente certo de que o apelido é Ochoa.

— Sim, bom... Volta a levar Benny para a sua cela quando tiver terminado de falar com a advogada. Imagino que teremos que deixá-lo em liberdade, mas primeiro darei a essa advogada a oportunidade de protestar. Parece que está decidida a fazê-lo. Estarei no meu escritório.

— Claro, xerife.

Quinn regressou pelo labirinto de corredores e escadas até ao seu escritório. Lá encontrou a maior parte do seu pessoal, que o olhava com expectativa.

— O que é isto? Será que já se solucionaram todos os delitos deste país? Precisam de alguma coisa para fazer?

Com um suspiro, a sua secretária voltou a plantar-se diante da sua mesa, enquanto que os outros começavam a sair.

— Um momento, Rubén — disse o xerife para um deles. — Vem até ao meu escritório.

Rubén seguiu-o para o interior do escritório e fechou a porta.

— Por uma vez, Hargrove tem razão — comentou o agente, com um sorriso. — Aquela mulher é uma beleza.

— Sim, é uma beleza — admitiu Quinn, — porém, não penso que, nesta altura, esteja muito contente comigo. Rubén, queria perguntar-te se tens ideia de que Benny tivesse algum primo chamado Enrique Garza.

— Garza? — repetiu o agente Padilla. — Não penso que Benny seja familiar de nenhum dos Garza. Claro que não sei muito sobre a família do seu verdadeiro pai... porquê?

— Porque aquela advogada disse-lhe que o seu primo a tinha contratado e ele olhou-a como se estivesse prestes a engolir a língua e perguntou-lhe se se referia a Julio.

— Julio? — repetiu Ruben, desatando a rir-se. — Julio Fuentes? É tão provável que a minha filha de três anos encontre uma advogada e a contrate como Julio Fuentes.

— Essa foi a impressão que me deu pela expressão de Benny, mas, então, a menina Mendoza disse-lhe que o seu primo, Enrique Garza, tinha sido quem a tinha contratado. Pareceu-me que Benny reconheceu o nome, mas fez uma expressão muito estranha... Conheces alguém que se chame assim, mesmo que não esteja relacionado com Benny?

— Agora não, mas há muitos Garzas. Poderia ser de Hammond ou de outro lugar.

— Sim, pois. Agora vou telefonar à senhora Fuentes e vou ver se sabe quem é esse homem e que relação tem com o seu neto.

— Achas que a senhora Fuentes sabe que tem advogado?

— Suponho que não. Estou certo de que me vai pregar um bom sermão por não ter solto Benny...

— Antes a ti que a mim — replicou Rubén, sorrindo. — Já estava acostumado a isso quando lhe cortava mal a relva em miúdo.

— Ouve. Investiga um pouco a ver se descobres algo sobre esse Garza.

— Claro. Achas que se trata de alguém que está envolvido no que está a acontecer na casa do velho Rodríguez?

— Isso é o que suspeito.

— E pensas que a menina Mendoza também está ligada a eles?

— Não sei. Contrataram-na, mas aquela história do primo... Imagino que ela não tem nem ideia do que se está a passar.

Quinn não queria admitir, nem sequer para si mesmo, o quanto desejava que assim fosse.

 

 

— Estás a dizer-me que te prendeu porque tinhas um farol traseiro partido? — perguntou Lisa completamente atónita.

— Bom, não exactamente. Essa foi a razão pela qual me mandou parar. Então pediu-me os papéis e deu uma volta em redor do carro. Fez-me perguntas.

— Perguntas? Sobre o quê?

— Bom, já sabe — replicou Benny sem a olhar nos olhos. — Sobre onde tinha estado e com quem me relacionava. Coisas gerais — acrescentou, olhando-a de novo. — O que os polícias costumam perguntar. E disse-me que um carro como o meu tinha sido visto...

— Visto? Visto onde?

— Não sei bem. Não me disse exactamente. Eu... Mais ou menos, estava a puxar-me pela língua, como se estivesse à espera que dissesse alguma coisa que não devesse...

— Muito bem. O que achas que ele queria que dissesses?

— Não sei.

Lisa tinha a sensação de que o seu cliente, se não lhe estava a mentir, pelo menos, sabia mais do que lhe estava a contar. Não a surpreendia. Na faculdade tinham-lhe repetido mil vezes nas aulas de Direito Penal que o cliente mentia sempre. Ela mesma o tinha experimentado em casos anteriores. Todos os clientes queriam apresentar o seu melhor caso perante o seu advogado, embora isso supusesse ocultar dados que mais tarde pudessem prejudicá-los. Essa estratégia costumava ter más consequências, já que era raro que, mais cedo ou mais tarde, as mentiras não viessem à superfície.

Decidiu não pressionar Benny de momento. Fosse o que fosse que este lhe estava a ocultar, não importava no momento. O que importava era que o xerife Sutton tinha metido Benny com toda a celeridade na prisão.

— Então, quando não disseste o que ele esperava que dissesses, o que aconteceu?

— Disse-me que ia ter que me levar ao seu escritório.

— Disse-te porquê?

— Não sei... Talvez porque eu não lhe dizia nada.

— Foi isso exactamente o que te disse?

— Não me lembro muito bem do que me disse. Penso que me disse que queria fazer-me algumas perguntas e pediu-me que saísse do carro. Então viu que eu tinha uma lata de cerveja no chão e perguntou-me se tinha estado a beber. Eu disse-lhe que não, o que era verdade.

— E então fez-te um teste de alcoolémia.

— Não. Sabia que eu não estava embriagado, porém, ainda restava um pouco de cerveja na lata e disse-me que era menor e que tinha álcool... Uma coisa assim. Aquela lata de cerveja nem sequer era minha. Julio deixou-a no carro no dia antes, mas...

— Portanto, prendeu-te porque és menor e tinhas álcool em teu poder?

— Suponho que sim. Embora ambos soubéssemos que só me estava a reter.

— Porquê?

— Não sei. Suponho que porque não lhe disse o que queria ouvir. Levou-me ao seu escritório e fez-me um monte de perguntas. Em seguida, fez com que o agente Padilla me metesse na cela. Suponho que esperava que lhe dissesse alguma coisa só porque é mexicano.

— Quando aconteceu tudo isso?

— Anteontem.

— E estás aqui desde então? Acusou-te formalmente ou levou-te a tribunal para prestar declarações?

— Não estive em nenhum outro sítio além da minha cela.

— Disse de que te acusava?

— Não sei bem. Suponho que de ter álcool, apesar de ser menor. Disse-me que me ia deixar pensar nisso e que depois voltaríamos a falar. Acho que tentava assustar-me.

— Bateu-te? Magoou-te de algum modo? Ameaçou-te?

— Não. Não é desse género. A maior parte do tempo é amável... Só está a jogar o seu jogo... E o meu.

Lisa suspirou. Aquela não era a primeira vez que se encontrava metida num jogo muito complicado, do qual só conheciam as regras a polícia e os seus clientes. O jogo de Benny era pretender que não sabia nada.

— Lembro-te, Benny, que, neste jogo, ele tem as melhores cartas — assinalou. — O melhor que podes fazer é não jogar. Deves guardar silêncio e chamar pelo teu advogado. Fá-lo-ás?

— Sim. Vai tirar-me daqui?

— Sim. Quando tivermos acabado, irei falar com o xerife. Sabe perfeitamente que não tem nada para te reter aqui. Se se recusar a soltar-te, conseguirei uma ordem e iremos a tribunal.

habeas corpus

Lisa sublinhou cada uma das suas palavras com um enérgico movimento do dedo indicador. A sua fúria fazia com que cada vez se fosse aproximando mais, até que esteve prestes a tocar no xerife com o dedo. Quinn pensou em agarrar-lhe a mão e aproximá-la mais ao seu corpo para silenciar aquelas palavras com os seus lábios. Esse seria um bom modo de fazer com que ela o esbofeteasse. Claro que mereceria a pena...

Estiveram a olhar-se fixamente durante um longo instante. Lisa pôde ver a raiva que ardia nos olhos do xerife e sentiu o calor que emanava do seu corpo. Alguma coisa no seu interior parecia empurrá-la para diante para precipitar uma explosão final entre eles.

O xerife retesou o queixo. Então rodeou-a cuidadosamente e dirigiu-se à porta.

— Padilla! — rugiu depois de a abrir. — Solta Hernández. A sua advogada vai levá-lo para casa.